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0,9%, a taxinha anual do Pibão

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Por Roberto Macedo
4 min de leitura

Descabidamente o termo pibinho passou a ser usado como referência à pequena taxa anual de crescimento do PIB, o produto interno bruto brasileiro. No ano passado ela ficou em 0,9%, realmente merecedora de um diminutivo. Mas nosso PIB é enorme e nada tem de pibinho. Em 2012 alcançou R$ 4.402.537.000.000,00, em números redondos a partir dos milhões. Esse número enorme cai à metade se convertido em dólares e, mesmo assim, é um dos maiores do mundo, deixando o Brasil num sexto ou sétimo lugar, dependendo do valor do PIB de outros países no mesmo ano e da taxa de câmbio utilizada. A última edição da revista Veja veio com matéria sobre a taxinha de 0,9% em 2012, intitulada Gente, o PIB sumiu!. Como um PIB desse tamanhão poderia sumir? Só se viesse o fim do mundo e desaparecessem também os 193.946.886 habitantes do País, conforme dados de julho de 2012. Com esse outro grande número, o PIB por habitante foi de R$ 22.599,70 no mesmo ano. Em dólares, uma cifra perto de US$ 11 mil, a qual deixa o Brasil entre os países muito ricos e os muito pobres. Nessa segunda divisão também é chamado de país em desenvolvimento, mas com taxinhas como essa vai continuar por aí, e ultrapassado por outros corredores. Onde está o problema? Aqui o governo federal escolheu como bodes expiatórios a crise econômica mundial que veio em 2008 e a da zona do euro, que sobreveio em 2011, também contagiosa, ainda que em menor grau. Essas crises tiveram os seus impactos, que não se esgotaram desde então. Mas nossos problemas maiores estão aqui dentro mesmo e se nos dispuséssemos a encará-los e resolvê-los o Brasil deixaria taxinhas como essa de 2012 na poeira da História. Outra atitude importante seria a de não se contentar com outras na faixa de 3% a 4%, mas fixar como meta um mínimo de 5%. Essa percepção de taxinhas "made in Brazil" hoje está mais clara, pois basta ver aqui perto, na América Latina, que países também sujeitos às mesmas crises citadas mostram um desempenho bem melhor que o nosso. Dados do balanço preliminar de 2012 da Comissão Econômica para a América Latina (Cepal), da ONU, revelam que o Brasil teve a segunda pior taxa de crescimento entre os países de maior PIB (México, Argentina, Colômbia, Venezuela, Chile, Peru e Equador), todos com taxas de 3,8% ou mais. Com exceção da Argentina, que, segundo fontes privadas, teve seu crescimento estimado em 0,5%. Vale lembrar que dados econômicos argentinos de fontes oficiais não são confiáveis. No caso, a previsão oficial foi de 2%. Há vários anos insisto, neste e noutros espaços, em que a economia brasileira investe muito pouco na expansão da capacidade de produzir seu PIB de bens e serviços. Ou seja, em fábricas, fazendas, hospitais, estradas, portos e tudo o mais que tenha capacidade produtiva. No momento, por exemplo, uma safra recorde de grãos no Centro-Oeste está enfrentando enormes dificuldades para chegar aos portos e passar por eles, o que aumenta os custos dessa safra e diminui a sua competitividade. Em 2012 o Brasil investiu apenas 18,1% do seu PIB. E andando na contramão, pois em 2010 e 2011 havia investido a média de 19,4%. São taxas muito baixas, típicas de países já ricos, que, como tal, não precisam mais investir muito. Repetidas vezes vinha mostrando que os países de maior crescimento, a China e a Índia, investiam perto de 40% e 30%, respectivamente. Depois de ver os dados da Cepal, passei a citar taxas de investimento de países mais próximos na esperança de que seu exemplo seja mais observado e seguido. Em 2012 foram México (23,5%), Colômbia (27,9%), Venezuela (26,9%), Chile (27,7%), Equador (24,9%) e Peru (32,2%!). De tanto pregar o aumento da taxa de investimento do Brasil, em certo momento me perguntei se não estava a chover no molhado. Mas percebi que o terreno continuava seco ao ver os governos petistas a pregar e praticar sua crença de que o crédito e outras medidas pró-consumo seriam suficientes para estimular também os indispensáveis investimentos. Ora, isso pode ser válido no curto prazo, como para estimular o nível de atividade quando a economia passa por uma crise e consumidores e investidores estão retraídos. Porém depois, como hoje, o efeito dessas medidas tende a se esgotar, porque o endividamento cresce e o estímulo do crédito se reduz. Além disso, como também já aconteceu, o investimento e a produção - o lado da oferta - não cresceram na mesma proporção do estímulo dado à demanda, e a inflação aumentou. E mais: parte do estímulo também vaza para o exterior, mediante mais importações, ou seja, para o PIB de outros países. O investimento, por sua vez, gera emprego, produção e renda e, como no caso da infraestrutura, também pode contribuir para ampliar a competitividade de nossas exportações. Parece que a ficha da necessidade de maiores investimentos caiu em Brasília e soa como música ouvir discursos presidenciais falando de mais rodovias, ferrovias, ampliação de portos, parcerias público-privadas e coisas do tipo. Continuarei a pregação, pois não estou convencido de que o chão já esteja suficientemente molhado, e que esses discursos trarão efetivamente um substancial aumento da taxa de investimento. Quanto a isso, o maior investimento que o governo deve fazer no momento é na sua capacidade de realizar. Se as obras vierem - e não virão sem que os tocadores delas se sintam suficientemente encorajados com as suas perspectivas de lucro -, servirão também para dissipar a desconfiança hoje generalizada em torno da natureza e da efetividade da ação governamental. E melhoraria também a disposição daqueles que, mesmo não diretamente nelas envolvidos, observam o governo e ficam à espera de um sinal encorajador para realizar os seus próprios investimentos e ampliar o seu consumo.

* Roberto Macedo é economista (UFMG, USP e Harvard), professor associado à Faap e consultor econômico e de ensino superior.

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