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A China em mudança

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Por Redação
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Parece óbvio que o potencial da demanda interna representada por uma população de 1,3 bilhão de pessoas é decisivo para o comportamento da economia chinesa. Na prática, porém, a demanda interna não tem tido essa importância, e isso ficou claro no discurso com que o primeiro-ministro Wen Jiabao abriu a sessão anual do Congresso Nacional do Povo - ao final do qual transmitirá o cargo a seu sucessor, Li Keqiang.Para garantir que a economia cresça 7,5% em 2013 - o que confirmará o fim de três décadas de crescimento médio superior a 8% ao ano, já prenunciado pela expansão de 7,8% do PIB em 2012, o mais baixo desde o fim da década de 1990 -, o governo de Pequim executará um orçamento recorde e aumentará o déficit público para cerca de 2% do PIB (em 2012, foi de 1,6%). Além dos gastos públicos, o governo de Pequim espera contar com o aumento do consumo interno para impulsionar a atividade econômica.Há anos os dirigentes chineses falam em estimular o consumo, tanto por razões econômicas como sociais e políticas. O modelo seguido nas últimas décadas, que assegurou um longo período de crescimento acelerado, transformou a economia da China na segunda maior do mundo, superando a do Japão, e retirou da miséria mais de 400 milhões de pessoas, mas não conseguiu proporcionar melhores condições de vida à maioria da população em ritmo compatível com o aumento da produção.Apesar de seu extraordinário crescimento, a China continua almejando incluir-se entre os países de renda média. Mesmo que alcance essa classificação, continuará sendo um país desigual, em termos de renda e de condições de vida. Estimativas da ONU indicam que 13% dos chineses vivem com renda diária média inferior a US$ 1,25.A persistência desse quadro pode resultar em descontentamentos com impactos políticos imprevisíveis. Por isso, o governo chinês vem falando em mudança do modelo econômico, no qual diminua o peso dos investimentos, que têm sustentado o crescimento da economia, e aumente a participação do consumo interno. A produção, de sua parte, tenderá a se voltar menos para o mercado externo e buscar atender o consumidor local.A desaceleração das economias que mais importam da China, que reduziu para 6,2% a expansão do comércio exterior chinês (em 2011, o aumento tinha sido de 22,5%), tornou mais necessária a mudança do foco da política econômica para o mercado interno. "O desenvolvimento desequilibrado, descoordenado e insustentável continua a ser um problema proeminente", disse Wen em seu discurso. Por isso, o governo chinês deverá manter a expansão da demanda interna como a estratégia de crescimento de longo prazo, sem nunca se desviar dela, completou.É possível que, desta vez, as mudanças na economia mundial forcem o governo de Pequim a transformar em ações práticas o que até há pouco não passava de um discurso bem articulado e fundamentado em favor da melhora das condições de vida da população, por meio de elevação da renda e de estímulos ao consumo. Se isso ocorrer, os benefícios alcançarão outros países, entre os quais o Brasil, que terão a oportunidade de ampliar suas exportações para a China.Esta é, porém, uma entre muitas mudanças de que a China necessita para continuar a crescer no ritmo necessário para assegurar condições de vida dignas para sua população. Há disposição de parte das autoridades chinesas de, pelo menos, discutir essas questões.Há cerca de um ano, o governo de Pequim tornou público um documento conjunto, elaborado por técnicos chineses e do Banco Mundial, que aponta para o risco de uma crise econômica caso a China não faça outras reformas, destinadas a assegurar maior eficiência e competitividade. Entre as mudanças sugeridas estão a redução do papel das empresas estatais - que dominam o setor de infraestrutura - e a adoção, por elas, de modelos de gestão baseados na eficiência e nos resultados. Os resultados positivos dessas mudanças não se limitariam à economia chinesa.