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A crise, as prioridades e o FMI

A crise política gerada pelas denúncias contra o presidente Michel Temer surpreendeu dois grupos do Fundo Monetário Internacional (FMI) em visita ao Brasil e pôs em xeque, ainda sem efeito prático, suas informações e avaliações sobre a economia brasileira

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Por Redação
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A crise política gerada pelas denúncias contra o presidente Michel Temer surpreendeu dois grupos do Fundo Monetário Internacional (FMI) em visita ao Brasil e pôs em xeque, ainda sem efeito prático, suas informações e avaliações sobre a economia brasileira. Por enquanto, mantém-se para o País a projeção de crescimento econômico de 0,2% neste ano e de 1,7% no próximo, assim como as demais estimativas para a região. É muito cedo para qualquer prognóstico, disse em São Paulo o diretor do Departamento de Hemisfério Ocidental do FMI, Alejandro Werner. Os técnicos da instituição, acrescentou, vão acompanhar a crise para avaliar seus possíveis impactos. Werner veio a São Paulo para apresentar, em evento na Fundação Getúlio Vargas (FGV), as projeções fechadas em abril para América Latina e Caribe. As estimativas e a maior parte da análise foram concluídas há mais de um mês, mas o documento distribuído, bem mais amplo que o trabalho inicial, foi fechado há poucos dias. A nova crise estourou dois dias antes da entrevista marcada para a divulgação do relatório. A presença de dois grupos do FMI no Brasil é uma casualidade. As projeções para a região, trabalho atualizado periodicamente, são apresentadas, em cada ocasião, em um ponto diferente da América Latina. O outro grupo, chefiado pelo economista Alfredo Cuevas, veio ao País para a coleta de dados para o relatório anual sobre a economia brasileira. Missões desse tipo visitam periodicamente os países-membros do Fundo para examinar a evolução recente da economia, elaborar projeções e formular sugestões de política. Depois de aprovados internamente e discutidos com representantes do país, são divulgados para conhecimento internacional. A equipe chefiada por Alfredo Cuevas estava encerrando suas visitas e consultas em Brasília quando a crise começou. No dia seguinte, quinta-feira, o grupo visitante recebia um grupo de técnicos locais para um coquetel de agradecimento quando surgiram as primeiras informações sobre o discurso do presidente Michel Temer. Agradecer aos técnicos locais pela ajuda no trabalho é parte do costume. Assistir à eclosão de uma crise com potencial para afetar amplamente as conclusões do levantamento recém-concluído é com certeza fora da rotina. O relatório deve ser submetido à diretoria executiva do Fundo em julho. Até lá, espera-se, o quadro estará menos incerto. Nenhum membro de qualquer das duas equipes arriscou previsões ou avaliações sobre as consequências possíveis da crise, até porque o Fundo é uma instituição multilateral e a discrição diplomática é parte dos procedimentos normais. Mas foram bem claros em relação a alguns pontos. Segundo Werner, o Banco Central e o Tesouro atuaram de forma adequada para conter a instabilidade nos mercados. Além disso, lembrou o diretor, o País dispõe de um sistema financeiro sólido e de condições de segurança para enfrentar uma fase de incertezas. Mas o ponto mais importante foi o comentário sobre as questões de médio e de longo prazos. É preciso, realçou, manter as prioridades da política econômica, trabalhando pelo ajuste das contas públicas, pela contenção do endividamento e pela execução da pauta de reformas. Essa é a agenda necessária, insistiu, para a intensificação do crescimento econômico nos próximos anos. O mesmo tipo de política foi defendido por Alfredo Cuevas, também presente no evento. O panorama latino-americano é em geral positivo, com crescimento previsto de 1,1% em 2017 e 2% em 2018 (a média, é justo lembrar, é rebaixada pelo Brasil, maior economia da região, e pela arrasada Venezuela). Há diferenças entre países, mas algumas indicações valem para todos: reforçar a infraestrutura, cuidar do ambiente de negócios, elevar padrões educacionais e aprofundar a integração por meio do comércio intrarregional. Tudo isso vale para o Brasil, é claro, e é essencial para elevar a competitividade e criar melhores padrões de vida. Mas contas públicas saudáveis e reformas como a da Previdência são bases para tudo. Nenhuma crise elimina esse dado.