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A desativação do Minhocão

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Por Redação
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A aprovação pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Municipal de projeto de lei que desativa o Minhocão, seguindo diretriz estabelecida pelo Plano Diretor, abre uma discussão que precisa ser feita com a maior seriedade possível, sem concessões à demagogia. Tendo em vista a sua importância para o sistema viário da cidade, que só cresceu com o passar do tempo, não haverá solução fácil para o problema que se criará com o fim do Minhocão, se o projeto se transformar em lei.Para complicar a situação, há pouco tempo para esse debate, porque aquele projeto estará na pauta, juntamente com outros de iniciativa do Executivo e de vereadores, que a Câmara quer votar até o fim do ano. E a probabilidade de que a proposta seja aprovada é grande, pois ela conta com o apoio de vereadores de vários partidos - entre seus entusiastas estão Nabil Bonduki (PT) e Police Neto (PSD), por exemplo -, sem falar nas associações de moradores da região e de ambientalistas e urbanistas. Segundo Police Neto, é preciso convocar a sociedade e os governos estadual e federal para a discussão da proposta. A inclusão desses dois níveis de governo na questão é correta, mas ela mostra o tamanho do problema que a Câmara está em vias de criar, e que a cidade sozinha não tem, de fato, condições de resolver. Isso deveria, porém, ter sido feito muito antes. Agora, significa colocar o Estado e a União diante de um fato consumado, com sabor de chantagem - ou ajudam ou serão corresponsáveis pelas consequências negativas da medida.Em primeiro lugar, será preciso saber o que fazer com o Minhocão se sua desativação se der no prazo de quatro anos fixado pelo projeto. Desmontar essa enorme e pesada estrutura, tornada inútil, é uma operação muito cara, complicada e demorada. Vale a pena? Se não, resta a possibilidade de transformá-la numa área de lazer ajardinada, como já foi feito em caso semelhante - não idêntico - em Nova York. Área que até já tem nome - Parque do Minhocão. Dessa vez, deve-se perguntar se vale a pena tudo isso para deixar intocada essa estrutura, ainda que com tal destinação. Em segundo lugar, em qualquer uma daquelas opções, é preciso - como alertam o prefeito Fernando Haddad e técnicos de seu governo e como é evidente mesmo para leigos razoavelmente informados - encontrar uma alternativa para o Minhocão, que faz a ligação entre as regiões oeste e leste da cidade. Ele tem um fluxo médio de 6 mil veículos por hora em cada sentido, igual ao da Avenida 23 de Maio, o que basta para dar uma ideia do papel que desempenha no sistema viário.Uma opção, segundo Police Neto, é a Linha 6 - Laranja do Metrô, em construção, que cruzará a Marginal do Tietê, passará pela Barra Funda e atenderá a região em que se situam várias universidades na zona oeste. Outra é o Expresso Norte, que o governo do Estado espera concluir até 2020 e que vai passar pela região central, atendendo a área hoje servida pelo Minhocão, chegando até Perus. Supondo-se que uma ou outra dessas opções possa mesmo ser alternativa para o Minhocão - o que resta demonstrar -, a Câmara e a Prefeitura da capital estarão simplesmente, e sem um entendimento prévio, transferindo para o governo estadual o problema que criaram. Chova ou faça sol, ele terá então de cumprir o prazo de entrega daquelas obras, sob pena de deixar os paulistanos presos num infernal congestionamento de trânsito.E tem mais. Segundo Police Neto, será preciso impedir a especulação imobiliária na região do Minhocão, que se seguirá à sua desativação, pois quem viveu ali "40 anos não pode ser penalizado com aluguéis mais caros na hora em que tudo vai ficar bom". Como fazer isso ele não explicou.O Minhocão é mesmo uma desagradável herança urbanística, uma obra que enfeia a cidade. Mas ele se incorporou de tal forma à sua vida, tornando-se um elemento essencial de seu sistema viário, que sua desativação, a essa altura, não pode ser tratada com a ligeireza - que beira a irresponsabilidade - exibida pelos vereadores. Ainda há tempo para retomar a discussão nas bases técnicas que a questão exige. Em breve saberemos se o vereadores tomarão juízo.

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