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A greve do Judiciário federal

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Por Redação
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Deflagrada há quase dois meses, a greve dos servidores das Justiças Federal, Trabalhista e Eleitoral chegou a um impasse. Como pela legislação eleitoral o poder público é proibido de conceder reajustes salariais nos três meses anteriores e nos três meses posteriores às eleições, nenhum acordo poderá ser formalizado antes de janeiro de 2011, quando o País terá um novo governo. Mesmo assim, os grevistas decidiram manter a paralisia por tempo indeterminado. A categoria pede um aumento de até 56%, recusa o aumento da jornada de seis para oito horas diárias, pleiteia novas gratificações, exige a incorporação de vantagens pessoais aos salários e acusa o Ministério do Planejamento de se recusar a discutir o "mérito" das reivindicações. Enviadas ao Congresso sob a forma de um projeto de reestruturação de carreiras, que pode causar um impacto de R$ 7 bilhões no Orçamento da União, essas reivindicações têm o apoio dos presidentes dos tribunais superiores.Em nota oficial, o Supremo Tribunal Federal afirma que os salários do Judiciário estão "comprovadamente defasados em relação às carreiras públicas similares dos Poderes Executivo e Legislativo" e alega que os reajustes propostos têm por objetivo reduzir a rotatividade de pessoal decorrente da "falta de atratividade da remuneração". Pelo projeto, servidores que têm apenas instrução fundamental e exercem as "atividades de apoio", como copeiros e contínuos, poderão receber R$ 8.479,71. Profissionais de nível técnico, como analistas, teriam seus salários aumentados para R$ 18.577,88. E funcionários de nível superior receberiam R$ 33.072,55 ? acima do teto salarial fixado pela Constituição para o serviço público, que hoje é de R$ 26.723,13. São valores cinco ou seis vezes superiores à média dos salários pagos pela iniciativa privada para as mesmas funções, segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados. O projeto, que já foi aprovado pela Comissão do Trabalho na Câmara, aguarda análise da Comissão de Finanças e vem sendo criticado tanto pela situação quanto pela oposição, que se recusam a votá-lo. O líder do governo, Cândido Vaccarezza (PT-SP), afirma que ele pode provocar um efeito cascata sobre as demais categorias do funcionalismo federal, agravando a crise fiscal. Os líderes da oposição alegam que é uma bomba programada para explodir no próximo governo. Por seu lado, o presidente Lula disse que o destino do projeto só deveria ser decidido após a escolha de seu sucessor, pois ele é quem terá de pagar a conta do aumento dos servidores. A greve já comprometeu o funcionamento dos tribunais em 22 Estados, alastrou-se para algumas Justiças estaduais e vem causando vultosos prejuízos a quem depende da Justiça. Com os serviços administrativos e cartorários prejudicados, as audiências foram suspensas, afetando cidadãos e empresas que são partes em processos. É o caso de trabalhadores que aguardam a liberação de indenizações e de companhias que não conseguem obter alvarás e certidões necessários para contrair empréstimos bancários, participar de licitações e levantar os valores de depósitos judiciais já liberados por determinação judicial. A paralisação dos servidores judiciais, que mais uma vez convertem a sociedade em refém de reivindicações salariais, decorre de um velho problema estrutural do Estado brasileiro. Durante décadas, a Justiça teve autonomia para definir a política salarial e as vantagens de seus servidores. A prerrogativa é o corolário do princípio da tripartição dos Poderes. O problema é que o cofre é um só e a responsabilidade pelo que entra e pelo que sai é do Executivo. E, até a aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal, há dez anos, o Judiciário não aceitava pedidos de explicação a respeito da destinação do dinheiro, tendo adotado políticas salariais irrealistas. Seus servidores se acostumaram a apresentar reivindicações absurdas e a fazer protestos irresponsáveis para vê-las atendidas. Passa da hora de a Justiça adequar seus gastos à realidade fiscal e orçamentária do Estado brasileiro.