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A greve nas universidades

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Por Redação
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A greve deflagrada por professores e servidores das universidades públicas paulistas, por aumento de salários, completou 40 dias e não há perspectiva de que possa ser encerrada tão cedo.Lembrando que o comprometimento com a folha de pagamento das três instituições passou do patamar prudencial adequado, o Conselho de Reitores das Universidades Estaduais Paulistas (Cruesp) propôs uma reunião com as entidades sindicais dos docentes e funcionários administrativos na próxima semana, mas com a condição de que a questão salarial não seja incluída na pauta. Já os líderes dos grevistas continuam afirmando que os ganhos da USP, da Unicamp e da Unesp com as aplicações de suas reservas técnicas no sistema financeiro permitem a concessão do reajuste pleiteado. Também reivindicam um aumento de 9,57% para 11,6% na cota do ICMS a que as três universidades têm direito. Segundo o Cruesp, o limite prudencial dos gastos da USP, da Unicamp e da Unesp com a folha de pagamento deveria ser de até 85% de seus respectivos orçamentos. Atualmente, contudo, a Unesp e a Unicamp consomem, respectivamente, 95,42% e 97,33% de seus orçamentos com salários. Na USP, esse gasto é de 105,3%, o que tem obrigado a instituição a recorrer às reservas técnicas. É por isso que o Cruesp decidiu não conceder qualquer reajuste salarial em 2014. Já o governo estadual resiste ao aumento do porcentual do ICMS destinado às três universidades públicas paulistas, alegando que os problemas financeiros por elas enfrentados decorrem não de falta de verbas, mas de má gestão. "A crise das universidades decorre de suas próprias decisões, adotadas de forma independente. O governo simplesmente repassa valores", disse o secretário da Fazenda, Andrea Calabi, quando o problema eclodiu. Diante do impasse, as corporações sindicais apelaram para os mais variados artifícios, propondo aos estudantes, docentes e servidores que debatam "as concepções da Reitoria sobre a universidade pública", busquem apoio político de "entidades científicas, movimentos sociais, personalidades e mídia alternativa" e peçam audiência ao governador Geraldo Alckmin. Apoiados pela bancada do PT na Assembleia Legislativa, os grevistas alegam que o partido de Alckmin (PSDB) quer privatizar as universidades públicas, por ser "neoliberal". A greve, no entanto, não paralisou totalmente a USP, a Unicamp e a Unesp nesses 40 dias. Pelo contrário, as unidades mais tradicionais das três instituições continuam funcionando normalmente, principalmente na pós-graduação. Apesar de mais afetada pela suspensão das atividades administrativas, a graduação manteve intocado o cronograma do primeiro semestre. As greves se tornaram tão rotineiras que as três universidades já aprenderam a conviver com elas. O problema é o impacto dessa forma recorrente de protesto a médio prazo, uma vez que ela desestimula alunos e atrasa pesquisas. Com ou sem invasões e depredações, a recorrência das greves na USP, na Unicamp e na Unesp também abre caminho para pressões corporativas, demagogia política e proselitismo ideológico nos órgãos colegiados, levando-os a se submeter à pauta sindical e a deixar de lado a discussão de questões fundamentais, como as reformas pedagógicas que precisam ser feitas e as medidas administrativas que precisam ser tomadas, a fim de que as três instituições possam exercer a autonomia universitária de forma mais eficiente e responsável. Por causa dessa perda de foco dos colegiados, algumas unidades estão transferindo suas pesquisas para centros ou núcleos mais autônomos e menos burocratizados. Outras adotaram políticas de endowment, criando fundos financeiros com recursos doados por ex-alunos e que geram renda contínua para financiar suas atividades acadêmicas. São iniciativas importantes, não há dúvida. Mas elas precisariam ser mais bem articuladas com base em projetos científicos e pedagógicos que o grevismo e o corporativismo há muito tempo impedem de ser formulados, o que tem levado as universidades públicas paulistas a perder posições nos rankings internacionais.