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A lógica da base aliada

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Por Redação
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Após a suada vitória na votação da Medida Provisória 665, em entrevista ao Estado na sexta-feira o ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, prestou um relevante serviço ao entendimento do modo petista de governar, ao traduzir com o habitual recurso à retórica e às obviedades a razão pela qual a cornucópia do poder está escancarada para garantir a chamada “governabilidade” a qualquer custo: “É evidente que quem ajuda o governo, quem vota com o governo, quem sustenta o governo, governa com o governo, tem prioridade nas indicações do segundo escalão. Aqueles que querem colaborar serão privilegiados”.

Mercadante, por razões óbvias, nem tentou explicar as razões pelas quais os “aliados” ajudam, votam e sustentam o governo, mas suas palavras deixam claro, muito mais do que ele próprio poderia admitir, que governar com o governo e ser recompensado com as almejadas “indicações do segundo escalão” não têm nada a ver com ideias, projetos ou o objetivo de somar forças em benefício do bem comum. Trata-se meramente de um escambo, uma barganha que se esgota na satisfação dos apetites, cada vez mais vorazes, de parlamentares interessados apenas em tirar vantagens de um governo desmoralizado e politicamente fragilizado. É o império do fisiologismo, a maior realização política do lulopetismo em 12 anos de poder.

Pontificou ainda o ministro-chefe da Casa Civil reforçando a inconsistência de seus próprios argumentos: “O governo vai sempre em busca dos votos da base, para sustentar as posições do governo”. Ora, um governo sustentado por uma base construída sobre objetivos programáticos comuns não precisa, por definição, ir “em busca” de apoios com os quais deveria contar por princípio. Se cada votação tem de ser pontualmente negociada em termos de toma lá dá cá, é porque não existe nenhuma “base” situacionista, mas interesses fisiológicos a serem satisfeitos. E é incrível que, como a atual discussão do ajuste fiscal bem o demonstra, o governo não consiga contar com o apoio espontâneo e firme nem mesmo da bancada de seu próprio partido, o PT.

Esse amplo esquema de “articulação política” para o qual a presidente Dilma Rousseff delegou plenos poderes ao vice-presidente Michel Temer – e consiste, basicamente, na distribuição de benesses em troca de apoio político, principalmente cargos no segundo e no terceiro escalões – deixa claro que as muitas funções não preenchidas na gigantesca estrutura governamental não são indispensáveis ao bom funcionamento da administração pública, pois o Planalto não tem pressa em preenchê-las, condicionando as nomeações a acordos políticos pontuais. Mostra, enfim, o inchaço do aparelho governamental, que abriga 39 ministérios, para atender muito mais aos interesses políticos dos governantes do que ao interesse público.

Não é por outra razão que os petistas são fervorosos defensores de um Estado forte, que supõe um governo amplamente aparelhado para intervir, “em benefício dos mais pobres”, em praticamente todas as atividades da vida nacional, especialmente as ligadas à produção de riquezas. Para os petistas, hoje confortavelmente instalados na nomenklatura, desde logo esse modelo já lhes está resolvendo os problemas de sobrevivência. Eles compõem a casta dirigente do País – não confundir com a “elite”, que na definição lulopetista é a casta que conspira contra os interesses nacionais.

Se o governo tem tantos cargos de segundo e de terceiro escalões que podem permanecer vagos indefinidamente ao sabor de interesses que não são necessariamente os da boa gestão da coisa pública, e o maior empenho de Dilma Rousseff com o chamado ajuste fiscal é cortar despesas para equilibrar as contas públicas e permitir a retomada do crescimento econômico com novos investimentos, por que então não se promove um amplo enxugamento da adiposa máquina governamental, a começar pelo corte dos cargos que não atendem prioritariamente a uma governança eficaz?

A resposta a essa pergunta é óbvia: porque o PT entende que uma função essencial do governo é criar empregos, a começar, é claro, por aqueles que não dependem do mercado, mas de uma caneta.