Imagem ex-librisOpinião do Estadão

A nova barreira cambial

Exclusivo para assinantes
Por Redação
2 min de leitura

Em mais um esforço para conter a valorização do real, o governo elevou de 2% para 4% o imposto sobre o capital estrangeiro aplicado em papéis de renda fixa. A ideia é reduzir o apetite dos investidores pelos juros brasileiros, situados entre os mais altos do mundo. A novidade foi anunciada um dia depois do primeiro turno da eleição. Seis dias antes, em 28 de setembro, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, havia negado a necessidade do aumento, repetindo uma declaração do dia 27. A decisão foi uma resposta ao novo patamar de valorização do real. Na semana passada, pela primeira vez em dois anos, o dólar foi cotado abaixo de R$ 1,70. Levará algum tempo para poder avaliar se a nova taxação produzirá o efeito desejado. O próprio governo não leva muita fé nos efeitos da medida. Ele sabe que a longo prazo, medidas como essa tendem a perder efeito, mas o seu objetivo, neste momento, é barrar a inundação do mercado brasileiro por uma enxurrada de dólares. Com o mundo rico ainda em crise e muita incerteza quanto ao sistema financeiro da Europa e dos EUA, o Brasil e outros emergentes têm atrativos especiais. No caso brasileiro, os juros muito altos são um atrativo importante.Desde 2009, o capital estrangeiro investido em ações e em papéis de renda fixa era taxado com 2% de IOF. Essa política recompôs, em parte, o fluxo de dólares, com maior concentração no mercado de renda fixa. Os juros continuaram muito atraentes e o impacto da medida foi limitado, segundo economistas do FMI. Mas funcionará melhor a nova barreira? Agora, a alíquota do IOF dobrou e incidirá somente nos investimentos em renda fixa. "O jogo pode ser diferente", disse ontem o diretor do Departamento dos Mercados Monetário e de Capitais do FMI, José Viñals. Mas, cauteloso, ele acrescentou que será preciso esperar algum tempo para avaliar a eficiência da medida. O FMI é hoje bem mais flexível em relação a ações de controle de capitais. Durante décadas, o Fundo fez forte oposição a políticas de tipo restritivo. A liberalização dos mercados ainda é um objetivo desejável, mas o discurso mudou de tom. A mudança ocorreu quando se agravou a crise financeira iniciada em 2007. Hoje, o controle dos fluxos é considerado um dos instrumentos à disposição dos governos. Mas seus efeitos - isso é sempre ressaltado - tendem a diminuir depois do impacto inicial. Os investidores sempre descobrem novos caminhos para fazer transitar seu dinheiro. O governo teve pelo menos dois motivos para só elevar a barreira às aplicações no mercado de renda fixa. Em primeiro lugar, esse é um alvo especialmente atrativo por causa dos altíssimos juros brasileiros. Em segundo lugar, restringir o ingresso de capitais no mercado de ações pode ser contraproducente, quando empresas brasileiras - a começar pela Petrobrás - precisam de volumosos recursos para investir. Os capitais destinados ao investimento direto já ingressavam e continuarão ingressando sem obstáculos. Desde o agravamento da crise, economistas do FMI e de outras instituições previram o aumento dos fluxos de recursos para os países emergentes em melhores condições. Rapidamente se confirmou a presença do Brasil nesse grupo, já que o sistema financeiro nacional se manteve basicamente saudável e a recessão foi curta. Esse movimento deveria provocar a valorização das moedas desses países. O aumento de suas importações seria uma das consequências. Os brasileiros não teriam motivo para reclamar, se esses efeitos ocorressem somente na China e em algumas economias com grandes superávits externos. Mas a valorização da moeda foi maior no Brasil do que na China, com efeitos indesejáveis no comércio exterior e nas transações correntes do balanço de pagamentos. O quadro global depende principalmente de dois atores, porque os chineses mantêm sua moeda subvalorizada e os americanos continuam provocando uma inundação de dólares, com sua política monetária frouxa. Enquanto os dois gigantes persistirem nesse jogo, os demais terão de seguir a regra do cada um por si.