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A pretensão dos delegados da PF

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Por Redação
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Depois de terem reivindicado durante anos prerrogativas equivalentes às dos membros do Ministério Público, os delegados da Polícia Federal pretendem ter as mesmas garantias funcionais que a Constituição concede aos magistrados. A corporação alega que, sem vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos, a Polícia Federal não tem a força necessária para combater a corrupção e o crime organizado. "É comum a interferência de outros Poderes e mesmo da máquina governamental nos procedimentos conduzidos por delegados federais", diz o líder sindical da categoria, reivindicando o mesmo tratamento jurídico dado pela Constituição às chamadas "carreiras jurídicas de Estado". Além do lobby montado para persuadir deputados e senadores a aprovar Propostas de Emendas Constitucionais pertinentes às suas atribuições, os delegados federais estão tentando obter apoio do governo. Às vésperas do Natal, eles convidaram o ministro da Justiça - ao qual a Polícia Federal é subordinada - para um jantar de confraternização e pediram que defendesse as pretensões da corporação junto ao Palácio do Planalto. Político experiente, o ministro Martins Cardozo limitou-se a dizer que era "sensível à causa". A mobilização dos delegados federais começou depois que os tribunais começaram a anular as provas obtidas em operações espetaculosas realizadas pela Polícia Federal. No cumprimento de vários mandados de busca e apreensão de documentos, por exemplo, houve invasão de residências e de escritórios de advocacia. Alguns delegados federais também abusaram das prisões temporárias, submetendo investigados a constrangimentos e recorrendo de forma abusiva ao uso de algemas. E, com o objetivo de obter autorização judicial para grampear os telefones de pessoas sobre as quais não pairam suspeitas de irregularidades, encaminharam aos juízes pedidos vagos e infundados. Ao trancar ações criminais abertas com base em provas obtidas por vias ilícitas, os tribunais superiores criticaram a banalização das prisões temporárias e afirmaram que elas poderiam levar a um "Estado policial midiático". Também consideraram desnecessárias prisões efetuadas ao amanhecer, quando os investigados ainda estavam dormindo. E observaram que, na condução de alguns inquéritos, houve invasão de privacidade, vazamento de informações sigilosas para pressionar magistrados e acordos indevidos com jornalistas. Em resposta, os delegados federais classificaram as decisões dos tribunais superiores como uma limitação ao seu poder de investigar. Em setembro do ano passado, quando o Superior Tribunal de Justiça determinou a anulação das provas coletadas pela Operação Boi Barrica, delegados federais acusaram o Poder Judiciário de "estar a serviço das elites" e de abrir "a porta para a impunidade no País". Em suas críticas à Justiça, alguns delegados recorreram a chavões ideológicos e um deles, apresentando-se como paladino da moralidade, converteu as operações espetaculosas e arbitrárias das quais participou em bandeira para se eleger deputado. Se conquistarem as mesmas prerrogativas da magistratura, como pretendem, os delegados federais só poderiam perder o cargo mediante sentença judicial transitada em julgado. Também não poderiam ser removidos por razões funcionais e as corregedorias passariam a ter dificuldade para instaurar medidas disciplinares contra delegados acusados de exorbitar nas investigações e de cometer irregularidades nas elaboração de inquéritos. Além disso, os policiais ficariam livres do controle externo que hoje é promovido pelo Ministério Público. E, como integrariam uma "carreira jurídica de Estado", passariam a receber o equivalente a 95% dos vencimentos dos ministros do STF. Mas o mais importante é que a Polícia Federal teria a mesma autonomia funcional da Procuradoria da República, do Legislativo e do Judiciário, convertendo-se numa instituição autônoma e independente e comprometendo o princípio da tripartição dos Poderes, que é a essência do Estado de Direito.