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A vitória do bom senso

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Por Redação
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Os eleitores paraenses demonstraram sensatez ao rejeitar, por ampla maioria, a divisão de seu Estado em três. Eles entenderam que o desmembramento do Pará, para a criação dos Estados de Tapajós e Carajás, não significaria a solução automática dos problemas enfrentados pelas populações das regiões mais afastadas da capital. No primeiro plebiscito da história do Brasil sobre a divisão de um Estado, dois terços dos eleitores votaram pela preservação do Pará na sua configuração atual (66,1% votaram contra a criação de Tapajós e 66,6% rejeitaram a criação de Carajás). A esmagadora vitória do "não" - os eleitores deveriam votar "sim" ou "não" à proposta de criação de cada um dos dois Estados - não é, porém, suficiente para acabar com o grande descontentamento dos moradores das áreas que constituiriam os novos Estados.Dos eleitores de Santarém, 98,6% votaram pela criação de Tapajós (do qual o município seria capital) e 97,8%, pela criação de Carajás. Em Marabá, 92,9% votaram pela criação de Tapajós e 93,3%, pela criação de Carajás (do qual Marabá seria capital). Nos demais municípios que fariam parte dos dois Estados a votação não foi muito diferente.A vitória do "não" foi assegurada basicamente pelos eleitores da área que continuaria sendo chamada de Pará se vencesse o "sim" - que representa apenas 17% do território estadual, mas abriga a capital, Belém, e onde vivem cerca de 65% da população de todo o Estado. É um índice muito próximo do porcentual alcançado pelo "não" no plebiscito de domingo. Ou seja, foram os eleitores das áreas mais próximas da capital que garantiram a preservação da unidade do Estado.Além de interesses político-partidários e pessoais que moviam os líderes separatistas - a criação de novos Estados geraria dezenas de cargos eletivos, exigiria a contratação de milhares de funcionários, muitos sem necessidade de concurso, entre outras vantagens para eles -, havia outra motivação. A concentração das riquezas do Pará nas regiões que formariam os novos Estados também mobilizou as lideranças locais. A região sul, que formaria o Carajás, tem a maior reserva de ferro do mundo e concentra boa parte dos investimentos da Vale. O oeste, que formaria o Tapajós, terá a hidrelétrica de Belo Monte, projetada para ser a terceira maior do mundo.Apesar disso, essas regiões carecem de serviços públicos em áreas essenciais, como saúde, educação e segurança, e não dispõem de infraestrutura adequada. Suas populações se consideram esquecidas pelo governo do Estado. Para conseguir a vitória do "sim", os líderes do movimento separatista procuraram explorar ao máximo esse sentimento, tentando limitar o plebiscito às áreas dos dois Estados que seriam desmembrados - ou seja, estariam excluídos os eleitores da área que seria o Pará depois de dividido. O STF, no entanto, determinou que os eleitores de todo o Estado participassem do plebiscito.Contrário à divisão, o governador do Pará, Simão Jatene, reconheceu a legitimidade das reivindicações dos separatistas, por mais serviços do governo estadual, e admitiu que "há distância e ausência" do Estado nas regiões que queriam se separar. "A aspiração é legítima", admitiu Jatene, mas "o caminho é equivocado". De fato, a separação não asseguraria melhores serviços - e, mesmo assim, aumentaria os gastos públicos, pois novas estruturas administrativas e políticas teriam de ser montadas com o dinheiro do contribuinte.Mas é preciso que esse reconhecimento não se limite ao discurso. É preciso aproximar o governo do Estado das populações, pois só assim será possível aferir suas carências e definir as prioridades dos programas públicos para essas regiões.O que ocorreu no Pará deve ser visto como advertência por outros governos estaduais. Tramitam no Congresso 23 projetos de criação de Estados. Quanto mais falhar a ação dos governos nas regiões que podem dar origem a novos Estados, mais fortes serão os movimentos separatistas.