Imagem ex-librisOpinião do Estadão

As demissões nas fábricas

Exclusivo para assinantes
Por Redação
2 min de leitura

A indústria continua demitindo e dificilmente voltará a contratar nos próximos meses, a julgar pelo baixo índice de confiança dos empresários do setor. Com os cortes de março, o quadro de pessoal ficou 0,6% menor que no mês anterior e o número de horas pagas diminuiu 0,3%. Nenhuma surpresa. A produção industrial ficou praticamente estagnada nos últimos quatro anos, com breves fases de crescimento logo seguidas de quedas. O aperto econômico deste ano, com juros em alta e arrocho das contas públicas, deve agravar a curto prazo uma crise iniciada bem antes da campanha eleitoral do ano passado. Se o governo avançar em sua arrumação e recobrar alguma credibilidade, haverá condições para investimentos e para uma reativação das fábricas. Por enquanto, as expectativas do empresariado continuam muito ruins, como indica a última sondagem da Confederação Nacional da Indústria (CNI), divulgada na terça-feira.

O estado de espírito apontado por essa pesquisa ainda é muito ruim. O Índice de Confiança do Empresário Industrial (Icei) subiu 0,1 ponto entre abril e maio e chegou a 38,6 pontos. Números abaixo de 50 correspondem a avaliações negativas da economia nacional. Neste mês, o indicador ficou 9,4 pontos abaixo do registrado em maio de 2014 e 17,6 pontos abaixo da média histórica. 

Há um ano havia algum sinal de otimismo pelo menos entre os empresários do setor extrativo (50,3 pontos). Neste mês, estão abaixo de 50 os índices dos três segmentos considerados, indústria da construção (38,7), indústria extrativa (41) e indústria de transformação (38,4).

As fábricas, unidades típicas do terceiro segmento, vão mal há muitos anos, com exceção de umas poucas indústrias, com destaque para a produtora de aviões. A crise das construtoras, mais recente, confirma o fiasco da política habitacional e dos planos de infraestrutura – logo, do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), principal vitrina do governo.

As demissões na indústria são o efeito mais doloroso dos erros cometidos pelo governo federal desde o segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O conjunto de equívocos foi enorme: favores fiscais e financeiros a setores e grupos, protecionismo, intervenção nos preços, tolerância à inflação, desperdício de dinheiro público e incentivos dirigidos mais ao consumo que à produção e ao investimento. Além disso, a política de comércio exterior foi no sentido oposto ao do estímulo à busca de competitividade e de integração nas cadeias de valor.

Os números do emprego, já em queda bem antes do ajuste iniciado neste ano, refletem com clareza essa coleção de enganos e desmandos. Em 12 meses, o pessoal ocupado na indústria diminuiu 3,9%. A redução das horas pagas chegou a 4,6% e a folha de pagamento real – descontada a inflação, portanto – encolheu 2,8%.

No primeiro trimestre o pessoal ocupado foi 4,6% menos numeroso que entre janeiro e março de 2014. Nessa comparação, as horas pagas diminuíram 5,2% e a folha real de salários, 4,9%. A deterioração, portanto, acentuou-se nos últimos meses. O único sinal positivo, o aumento mensal de 0,1% da folha real pouco ou nada significa. Em março, o total pago aos trabalhadores foi 4,3% menor que a soma de um ano antes.

O emprego industrial encolheu 5% em 2009, por causa da recessão. A economia cresceu 7,5% em 2010, mas o pessoal empregado na indústria só aumentou 3,4%, menos que o necessário para restabelecer o nível anterior à crise. Subiu mais 1% em 2011 e a partir daí recuou seguidamente. Diminuiu 1,4% em 2012, 1,1% em 2013 e 3,2% em 2014. Nos 12 meses terminados em março deste ano a redução chegou a 4,6%. Apesar de tudo, a folha real de salários só começou a minguar em 2014.

Todas as projeções indicam mais um recuo da produção em 2015 e uma pequena recuperação em 2016. As condições de emprego, portanto, continuarão ruins, e isso se refletirá, como já vem ocorrendo, no consumo. Quanto mais prontamente o governo conquistar credibilidade, tanto mais cedo poderá começar a reativação. Confiança, nesta altura, é o insumo mais raro e mais precioso.