Imagem ex-librisOpinião do Estadão

As negociações Mercosul-UE

Trata-se de tema que as duas partes vêm negociando desde 1999, mas até agora pouco se avançou na direção do entendimento

Exclusivo para assinantes
Por Redação
2 min de leitura

A retomada das negociações entre o Mercosul e a União Europeia (UE) de uma forma prática e ampla como não ocorria há 12 anos pode acelerar os entendimentos para a conclusão do acordo de livre-comércio entre os dois blocos. Trata-se de tema que as duas partes vêm negociando desde 1999, mas até agora pouco se avançou na direção do entendimento. Objetivos e interesses divergentes têm sido um obstáculo concreto à conclusão do acordo que dirigentes de países dos dois blocos não raro exaltam como interessante e benéfico para ambos, e por isso urgente.

A reunião de uma semana que representantes das duas partes realizam em Genebra está permitindo o exame das propostas que os dois blocos conseguiram articular, bem como o exame e a avaliação das divergências entre elas. Estas continuam sendo muitas, como mostrou reportagem do Estado, e isso já era previsível, mas o fato de os dois blocos terem voltado a negociar de modo mais eficaz alimenta as esperanças de que, especialmente no caso do Brasil, se alcance num prazo razoável acesso facilitado a um mercado tão grande e diversificado como o europeu.

Depois das primeiras negociações realizadas há 17 anos, uma malsucedida troca de propostas em 2004 paralisou os entendimentos por seis anos. Do lado sul-americano, a resistência do governo argentino, então dominado pelos Kirchners, à abertura do mercado local limitava o âmbito das propostas do bloco. Reiniciadas em 2010, as negociações resultaram em várias rodadas. A reunião de Genebra pode se tornar a mais ampla e produtiva delas.

Há pouco, durante a reunião que formalizou a nova configuração da Câmara de Comércio Exterior (Camex) – agora subordinada diretamente à Presidência da República –, o presidente Michel Temer defendeu a aceleração dos entendimentos para a conclusão do acordo Mercosul-União Europeia, como forma de aproximar comercialmente o Brasil de parceiros selecionados. “Precisamos romper o relativismo, o isolamento externo dos últimos anos”, disse Temer.

Ao longo da administração petista, de fato, o Brasil, ao contrário de outros países emergentes e mesmo da América Latina, não procurou estabelecer relações comerciais bilaterais, de modo a compensar o atraso – e depois o fracasso – das negociações de liberalização do comércio mundial realizadas no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC). Daí o presidente referir-se ao isolamento do País, o qual pretende romper. Na Argentina, a posse de Mauricio Macri na presidência, encerrando a chamada era Kirchner, marcada pelo nacionalismo e pelo isolamento do país, igualmente abriu mais espaço para as negociações do acordo com a União Europeia.

Muitas divergências continuam sobre a mesa de negociações. Em maio, o Mercosul apresentou a proposta de redução em 15 anos de tarifas que cobre 87% das linhas tarifárias, menos do que os 89% que haviam sido acertados em encontros anteriores. A Europa propôs a redução de 89% das linhas, com prazo menor (de 10 anos) para sua efetivação.

A proposta da UE, no entanto, exclui produtos de grande interesse para os exportadores do Mercosul, como açúcar, e fixa cotas para a entrada de outros itens, como a carne, da qual os países do bloco sul-americano são importantes fornecedores mundiais. Representantes do Mercosul já adiantaram que são restrições praticamente inaceitáveis.

Da parte da Europa, são igualmente fortes as resistências à redução das tarifas para produtos considerados “sensíveis” de origem do Mercosul, especialmente as carnes bovina e de frango. Não sem razão, por isso, há algum tempo dirigentes da UE da área agrícola vêm recomendando aos representantes do Mercosul que reduzam suas expectativas com relação à amplitude do acordo que vier a ser concluído.

A despeito da distância que separa as propostas dos dois lados, diplomatas ressaltam que o simples fato de as reuniões de Genebra poderem, finalmente, colocar em funcionamento os mecanismos de negociação já é positivo.