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As prisões e os direitos humanos

A gravidade da situação do sistema prisional brasileiro foi atestada pelo balanço do CNJ, que revelou que o País começou 2017 com 655 mil presos – 7% a mais do que em 2016. Desse total, 434 mil já têm condenação e 221 mil ainda aguardam julgamento

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Por Redação
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No mesmo dia em que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) divulgou o balanço do sistema prisional pedido pela presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, depois das rebeliões nas penitenciárias de Manaus, Boa Vista e Natal, a Corte Interamericana de Direitos Humanos, em decisão inédita, juntou num único processo quatro casos de violação de garantias fundamentais de direitos humanos de presos e intimou o governo brasileiro a responder a 52 perguntas sobre a situação dos presídios até 31 de março.

Os casos investigados pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, órgão vinculado à Organização dos Estados Americanos (OEA), ocorreram entre 2013 e 2014 nos complexos penitenciários de Curado, em Pernambuco; de Pedrinhas, no Maranhão; do Instituto Plácido de Carvalho, no Rio de Janeiro; e da Unidade de Internação Socioeducativa, no Espírito Santo. A Corte incorporou essas quatro denúncias num único processo porque o Brasil não estaria cumprindo determinações da Convenção Americana de Direitos Humanos, da qual é signatário.

As 52 perguntas encaminhadas pela Corte ao governo brasileiro cobram dados estatísticos sobre mortes de presos e informações sobre corrupção de agentes penitenciários. No documento de intimação, o órgão pede ao Estado brasileiro a adoção imediata de sete medidas para desafogar o sistema prisional e garantir um mínimo de dignidade aos presos sob sua tutela. Caso as perguntas não sejam respondidas e as medidas pedidas não sejam adotadas, a Corte pode aplicar multas e sanções.

A gravidade da situação do sistema prisional brasileiro foi atestada pelo balanço do CNJ, que revelou que o País começou 2017 com 655 mil presos – 7% a mais do que em 2016. Desse total, 434 mil já têm condenação e 221 mil ainda aguardam julgamento. Esse balanço é preliminar, pois o Censo Carcerário encomendado por Carmem Lúcia demorará meses para ser concluído.

O balanço foi feito com base em dados fornecidos por quase todos os presidentes dos Tribunais de Justiça (TJs) e tem o mérito de explicitar os problemas das Justiças estaduais na área criminal. Apenas os TJs de Tocantins e Mato Grosso do Sul não encaminharam informações. Os demais tribunais enviaram dados referentes ao número de presos e informaram sobre as iniciativas adotadas após as rebeliões do início do ano para desafogar as unidades prisionais, como promoção de mutirões, aumento no número de audiências e remanejamento de juízes para as Varas de Execução Penal mais congestionadas.

Ao analisar as planilhas e gráficos recebidos, o CNJ detectou problemas no controle de prazos e julgamentos nos TJs. Também descobriu que alguns tribunais encaminharam atos normativos sobre as iniciativas adotadas sem, contudo, terem tomado qualquer providência para implementá-las. Observou, também, que entre os TJs que adotaram alguma medida concreta, a maioria não formulou um cronograma de execução nem a criação de mecanismos de avaliação de resultados. Além de constatar falhas gritantes de planejamento, o CNJ verificou que os bancos de dados dos TJs não são alimentados com regularidade e que autoridades judiciais e penitenciárias de todas as unidades da Federação não adotam uma metodologia uniforme, em matéria de análise e coleta de informações. “Poucos tribunais encaminharam projetos com delimitação clara das atividades, definição de abrangência de ações e prazos”, conclui o levantamento do CNJ.

Com essas constatações, o CNJ mostra que o colapso do sistema prisional não decorre apenas da inépcia administrativa e da falta de determinação política do Executivo. Por causa de seu excesso de burocracia e incapacidade de julgar ações de modo mais ágil, as Justiças estaduais também têm grande parcela de culpa nesse problema.