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As promessas do pós-populismo

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Por Redação
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A mensagem mais animadora sobre a América Latina foi levada ao Fórum Econômico Mundial, em Davos, pelo novo presidente argentino, Maurício Macri, e por seus companheiros de delegação, incluído o deputado oposicionista Sérgio Massa, terceiro colocado na recente eleição presidencial. Eles estão apresentando um novo país: uma Argentina pós-populista, pronta para seguir novos padrões de política em todos os setores e preparada para uma plena reintegração no mercado internacional. Se o populismo foi de fato superado com a derrota do kirchnerismo, ainda é uma tese a ser verificada. Mas a importância atribuída a essa ideia pelo novo governo e por uma parcela da oposição é um indício muito positivo. Há outros sinais de amadurecimento político na região.

Ainda é difícil de pensar na América Latina sem evocar de imediato a imagem de uma região assolada pelo populismo, pela presença latente do golpismo e pela tendência às políticas econômicas irresponsáveis e irrealistas. A isso ainda é preciso juntar as tentativas frequentes de falsificar as instituições para ajustá-las às conveniências dos grupos no poder.

A mudança apenas iniciada na Argentina é mais um sinal de amadurecimento, mas especialmente bem-vindo quando somado à evolução já observada em alguns outros países, como Chile, Colômbia e Peru, formadores, com o México, da Aliança do Pacífico, um indício importante de compromisso com a liberalização e a maturidade diplomática. Mas ainda é preciso levar em conta a persistência do bolivarianismo e das simpatias bolivarianas, presentes no governo brasileiro e em grupos políticos importantes na Bolívia, no Equador e na própria Argentina.

A mensagem de Macri é, sobretudo, uma promessa de mudança num país assolado por sérias dificuldades econômicas. Para atrair investidores eles teriam de reconhecer os problemas e de indicar os caminhos escolhidos para arrumar as contas públicas, conter uma inflação superior a 20% ao ano, liberalizar o câmbio e criar uma economia mais competitiva.

A economia argentina cresceu 1,5% no ano passado e deve encolher 1% neste ano, segundo cálculos do FMI. É um desempenho ruim, mas bem menos desastroso que o do Brasil, com variações negativas de 3,8% em 2015 e 3,5% em 2016, de acordo com o mesmo conjunto de estimativas. Não se pode, nos casos desses e de alguns outros países, atribuir a contração econômica somente a fatores externos.

Esses fatores podem ter tido algum peso, mas os problemas têm origem principalmente interna. No Brasil e na Argentina a piora das relações de troca, por causa da baixa de preços dos produtos básicos, afeta menos de 1% do Produto Interno Bruto (PIB), de acordo com a análise do FMI.

Embora as estimativas do Fundo apontem resultados negativos para a média da América Latina e do Caribe, com diminuição do PIB de 0,3% em 2015 e em 2016, a maior parte das economias da região continua crescendo, embora em ritmo mais lento que o dos anos anteriores. Chile, Colômbia, México e Peru, para citar só alguns casos, cresceram no ano passado e devem continuar em expansão neste ano, com taxas entre 2,1% e 3,3%.

São números modestos, quando comparados com os de economias emergentes da Ásia e do Pacífico, mas razoáveis num cenário internacional de menores facilidades financeiras, preços de commodities mais baixos e ainda muita incerteza quanto ao prosseguimento da recuperação das economias mais avançadas. Estas, no entanto, continuam avançando, lideradas pelos Estados Unidos e pelo Reino Unido.

Os países latino-americanos com melhor desempenho são aqueles com fundamentos internos mais sólidos, menores desequilíbrios nas contas públicas e menor inflação e, portanto, maior espaço para políticas fiscais compensatórias. Não é o caso do Brasil nem tem sido o da Argentina. Mas o governo argentino parece ter descoberto o caminho da política sem mágica e sem mistificação. Se conseguirá segui-lo é outra história. Mas a descoberta já é uma grande novidade.