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Avanços em risco

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Por Redação
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Em 2014, 93,6% das crianças e adolescentes brasileiros estavam matriculados em escolas do ensino básico – ante 89,5% em 2005. Em números absolutos, isso significa que 5 milhões de brasileiros com idade entre 4 e 17 anos estavam sem estudar em 2005. No ano passado, eram 2,7 milhões – uma queda de 44,9%. Apesar desse avanço, o ensino básico está longe de superar seus gargalos, como mostram as taxas de evasão escolar, os índices de reprovação e os níveis de aproveitamento medidos por mecanismos nacionais e internacionais de avaliação. Essa é a conclusão de um estudo elaborado pelo Movimento Todos pela Educação, com base em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad).

Segundo o estudo, o maior salto nas matrículas do ensino básico ocorreu na faixa etária de 4 e 5 anos, na qual o acesso à pré-escola passou de 72,5% para 89,1%, entre 2005 e 2014. O aumento se concentrou basicamente nos estratos sociais mais vulneráveis: entre os 25% mais pobres, em comparação com os 25% mais ricos; na zona rural, em comparação com as áreas urbanas; e entre negros e pardos, em comparação com brancos; e na Região Norte, em relação às demais regiões do País.

Esse avanço é creditado a três fatores. Em primeiro lugar, à medida que se conscientizam da importância da educação para o futuro de seus filhos, os pais tendem a antecipar a matrícula nas escolas. Em 2006, a educação era a 7.ª prioridade das famílias – em 2014, já era a segunda prioridade, informa o estudo. Além disso, os municípios estão profissionalizando a gestão de suas redes escolares, o que resulta na ampliação da oferta de matrículas nas primeiras séries do ensino básico. Por fim, os recursos destinados a políticas sociais, como o Bolsa Família, estão ajudando a reduzir o trabalho infantil, permitindo que crianças que estariam trabalhando possam estudar.

“Crianças que frequentam uma educação infantil de qualidade têm um percurso escolar com mais aprendizagem e uma vida adulta com muito mais oportunidades. Investir nas crianças é a melhor estratégia para superarmos a desigualdade social, que ainda é muito alta e persistente. As crianças e os jovens mais vulneráveis são os que menos frequentam a escola. Portanto, são aqueles que mais dependem da educação para romper o ciclo de exclusão e pobreza”, diz a presidente do Movimento Todos pela Educação, Priscila Cruz.

Já entre os gargalos da educação básica, o maior está nas três séries do ensino médio, que permanecem com um currículo excessivamente acadêmico, do ponto de vista formativo, e inteiramente desconectado da realidade do mercado de trabalho. Por isso, o ensino médio é pouco atraente para os jovens, o que faz com que as taxas de evasão sejam altas – 9,5% na primeira série, 7,1% na segunda e 5,2% na última. “Desmotivado, o jovem não vê sentido na escola. Há uma discussão em andamento sobre a reformulação do ensino médio, a criação de escolas mais voltadas para a área de humanas, outras para a área de ciências naturais. É um ensino médio mais vocacionado, em que o aluno poderá trabalhar por projetos e ter metas de aprendizagem, em vez de ter disciplinas estanques, que não dialogam entre si”, afirma Priscila Cruz.

Uma das preocupações do estudo é o impacto da crise econômica no ensino. Seus autores lembram que os cortes de gastos públicos poderão retardar a velocidade dos avanços obtidos nos últimos anos e atrasar ainda mais a implementação de medidas destinadas a remover os gargalos do ensino básico. “Pode-se até melhorar a gestão do sistema escolar, mas é preciso construir escolas, contratar professores e comprar material. A falta de recursos tem reflexo direto nisso”, adverte a presidente do Todos pela Educação. Esse é o círculo vicioso em que nos encontramos. Sem crescimento econômico, não há recursos para a educação. Mas destravar a economia, para que ela volte a crescer, criando empregos e reduzindo as desigualdades sociais, exige formação de capital humano – que só investimentos em educação podem propiciar.