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Campo, indústria e ação global

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Por Redação
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O dinamismo do agronegócio tem sido o principal sustentáculo do comércio exterior brasileiro há vários anos. Ainda vigoroso no mercado internacional, ao contrário da maior parte da indústria, o setor faturou US$ 34,13 bilhões com as vendas externas e acumulou um superávit de US$ 28,13 bilhões de janeiro a maio deste ano. A receita correspondeu a 45,69% do total exportado pelo País e o resultado obtido quase garantiu o equilíbrio comercial. Nesses cinco meses, o saldo geral do comércio foi um déficit de US$ 2,30 bilhões. O semestre foi fechado com um pequeno superávit, de US$ 2,22 bilhões, e mais uma vez o jogo foi sustentado principalmente pelas vendas de produtos da agropecuária, em estado natural, como a soja em grão, e processados, como o suco de laranja e o açúcar cristal. Por quanto tempo o Brasil poderá depender tão amplamente do agronegócio como principal e mais segura fonte de dólares?

Mais um sinal de alerta foi aceso com a redução dos preços internacionais, mas a reação do governo federal tem sido muito lenta. As cotações da maior parte dos produtos agropecuários vendidos pelo Brasil está mais baixa que no ano passado. Os preços devem continuar em queda nos próximos dez anos, segundo as projeções divulgadas nesta semana pela FAO, a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura. Essa tendência será mantida principalmente pela combinação de dois fatores – maior oferta, decorrente de maior produtividade, e menor expansão da demanda global. Ainda assim, a maior parte dos preços, embora abaixo dos picos alcançados em 2007-2008, deverá continuar acima dos níveis do início dos anos 2000.

O cenário desenhado nas projeções da FAO é favorável ao Brasil. Segundo maior exportador de alimentos e matérias-primas agrícolas, atrás somente dos Estados Unidos, o Brasil poderá, segundo as estimativas, cobrir boa parte da demanda adicional, proveniente principalmente da Ásia.

O aumento da oferta, de acordo com o estudo, resultará principalmente de ganhos de produtividade, com rendimento maior das culturas, alguma conversão de pastos em lavouras e pecuária mais intensiva. A expansão da área usada na produção deve ser muito limitada, como tem ocorrido no último quarto de século. Mais investimentos em infraestrutura também poderão tornar o País mais competitivo.

Os ganhos de produtividade têm sido o grande fator de avanço da agropecuária brasileira há quatro décadas, detalhe ignorado por boa parte dos petistas. A contribuição da Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuária (Embrapa) foi essencial para a modernização do setor. Os pesquisadores continuam cumprindo essa tarefa, como comprova o recém-anunciado lançamento de um tipo de soja adaptado ao Matopiba, formado por terras de Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. Para essa área a ministra da Agricultura, Katia Abreu, apresentou um plano de desenvolvimento.

Mas o cuidado com o poder de competição da agropecuária, essencial diante da perspectiva de preços mais moderados, responde só a uma parte do desafio. É urgente repensar toda a política de crescimento e de atuação no mercado global. Sem descuidar do agronegócio, é preciso formular uma política geral de competitividade, considerando também as necessidades da indústria. É indispensável abandonar a ilusão do protecionismo e tolices como a distribuição de benefícios fiscais e financeiros a setores e grupos eleitos como favoritos da corte. O estado lamentável da maior parte da indústria brasileira é consequência de erros como esses – além, é claro, da manutenção de um sistema tributário irracional e de outros entraves.

É indispensável abandonar a desastrosa diplomacia comercial implantada em 2003, jogar no lixo o terceiro-mundismo requentado e buscar parcerias com os mercados mais importantes. Se o Mercosul for um entrave, como tem sido, a resposta adequada será repensar a integração regional. As ideias apresentadas pelos ministros do Desenvolvimento e da Fazenda apontam nessa direção. Não está claro se a presidente Dilma Rousseff entende a necessidade da mudança.