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Opinião|Como estará a economia daqui a alguns anos?

Atualização:

Nos dois primeiros meses do segundo mandato deste governo, enquanto as atenções se voltaram para as dificuldades imediatas e os ajustes necessários, fico pensando cada vez mais no fim desse processo. Como estará a economia daqui a alguns anos? Passado o período inicial de dificuldades, a economia estará um pouco melhor, num processo de recuperação (mesmo que moderado) do crescimento e do emprego? Ou, ao contrário, em 2018 estará em plena crise, no oitavo ano de uma década perdida que parecerá sem fim? Diante das dificuldades imediatas, essas perguntas parecem distantes. Voltamos a ser dominados pela necessidade de administrar o curto prazo, como no passado mais longínquo. O primeiro problema de curto prazo é o fiscal. Depois de deslizes contínuos nos últimos anos o resultado primário caiu de um superávit de 3%-4% do PIB para um déficit de 0,6% em 2014. A correção de rumo fiscal virou uma necessidade. Sem esse ajuste haverá o rebaixamento da nota soberana do Brasil, o que é um problema e tanto para um país que precisa captar pelo menos US$ 75 bilhões para financiar seu déficit em conta-corrente e outros US$ 102 bilhões para fazer frente aos vencimentos de dívida externa de curto e longo prazos só este ano. A conclusão é que não dá para postergar o ajuste fiscal. E nunca é fácil ajustar, ainda mais nas condições atuais. Sem apoio político não há ajuste fiscal. Sem um governo forte é difícil obter apoio político amplo. Voltamos ao tempo em que o imediatismo (ou seja, a emergência) domina a agenda do governo. E há outras emergências em curso. Após anos de congelamento ou atraso nos reajustes de preços administrados, o choque (ou realismo) tarifário é uma necessidade. O risco de racionamento de energia, por exemplo, deve acarretar um aumento médio de 50% nos preços da energia elétrica este ano, para ajudar a reduzir o consumo. O resultado de vários desses aumentos é uma inflação de administrados acima de 11%, o que deve levar a inflação medida pelo IPCA a ultrapassar o teto da meta, ficando acima de 7,5%. Do lado monetário, depois de alguns anos com inflação mais alta, o Banco Central quer reforçar seu compromisso de atingir o centro da meta de inflação (4,5%). Mas 2015 é o ano de realismo tarifário e de inflação acima do teto da meta. O foco é, então, 2016, o que exige uma postura mais dura da política monetária. No entanto, a economia está enfraquecida. Faz anos que os índices de confiança - do consumidor, do empresário, do setor industrial e de serviços - estão caindo. O investimento hoje representa apenas 17% do PIB. Há ainda a emergência relacionada às dificuldades da Petrobrás e às investigações da Lava Jato. A Petrobrás e seus fornecedores representam pelo menos 15% do investimento total do País. Só a Petrobrás já anunciou este ano um corte de 30% nos seus investimentos. Não é de surpreender que a economia pareça estar entrando em recessão, com perspectivas de queda do PIB no primeiro trimestre - e no ano. O foco nas emergências de curto prazo tem consequências imediatas. Para evitar a crise os ajustes acabam sendo adotados simultaneamente, e numa economia enfraquecida. É o típico enredo do fim do ciclo de excessos na política econômica (o velho custo da nova matriz de política econômica). As distorções vão se acumulando lentamente, para serem corrigidas rapidamente na emergência. Os ajustes simultâneos e pró-cíclicos são consequência desses excessos anteriores. Enquanto isso, o debate político concentra-se nos sintomas dos problemas, nos custos dos ajustes, em vez de enfocar as causas fundamentais que levaram à necessidade de múltiplos ajustes emergenciais. Os problemas do paciente rapidamente viram responsabilidade do cirurgião de plantão. Outro custo importante do imediatismo é a falta de horizonte. Torna-se difícil enxergar o futuro, mesmo o próximo, em meio a ajustes emergenciais. Mas é justamente esse horizonte que me intriga no momento. Qual será a situação da economia daqui a três, quatro anos? De que forma terminará esse período de ajuste? Existem algumas alternativas. Uma possibilidade é que esses ajustes não se sustentem por falta de apoio do governo (ou da sociedade). A interrupção dos ajustes minaria de vez a confiança dos investidores, empresários e consumidores. O rebaixamento da classificação de risco do Brasil levaria a uma parada brusca de financiamento externo e à necessidade de ajuste rápido e forte no balanço de pagamento. A crise externa desencadearia uma parada brusca na economia, com consequências fortes sobre a renda e o desemprego. O governo provavelmente usaria as reservas cambiais existentes para tentar suavizar o processo, mas com eficácia limitada. Daqui a três, quatro anos, a economia ainda estaria lidando com as consequências da crise. Uma alternativa benigna seria aquela em que os ajustes teriam apoio necessário para ser implementados plenamente, apesar de todas as dificuldades econômicas e políticas, levando à volta da confiança e dos investimentos. Os próximos anos seriam de recuperação da economia. A capacidade de enxergar o horizonte se abriria e a agenda poderia sair do curto prazo. O risco no cenário benigno é o distanciamento da crise provocar a complacência e a reversão dos ajustes. Num cenário intermediário os ajustes implementados seriam os mínimos necessários para evitar a crise, mas insuficientes para retomar a confiança e o crescimento. A agenda continuaria focada no curto prazo, sempre alerta para evitar o pior, mas sem forças para ir além. Eventos negativos reforçariam a reação do governo, melhoras paralisariam os esforços. O crescimento seria medíocre, mas não haveria queda substancial na renda nem aumento forte do desemprego. Seria uma década perdida, mas sem crise. Para alguns, seria um cenário pessimista; para outros, o melhor que se pode esperar. *Ilan Goldfajn é economista-chefe e sócio do Itaú Unibanco 

Opinião por Ilan Goldfajn