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Consumo, serviços e estagnação

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Por Redação
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A economia brasileira deve encolher em 2015 e completar dois anos de retração, segundo estimativas do mercado financeiro. O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, já admitiu a hipótese de um resultado negativo em 2014. Essa avaliação foi reforçada com a divulgação da receita do setor de serviços, calculada mensalmente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em dezembro, a receita nominal do setor, isto é, sem desconto da inflação, foi 4,2% maior que a de um ano antes. Durante o ano, o crescimento em relação a 2013 ficou em 6%. Foi o pior desempenho desde o início da série, em 2012. Considerada a evolução dos preços, sobra obviamente uma variação real negativa. A comparação de dezembro com o mesmo mês do ano anterior apontou recuo de 2,4%. No ano todo, a perda ficou em 1,1%, de acordo com a estimativa da consultoria Tendências. A avaliação final só será conhecida no fim de março, quando saírem os números do Produto Interno Bruto do quarto trimestre e o quadro geral de 2014.Tudo indica, por enquanto, um resultado negativo para o setor de serviços. Como o desempenho da indústria foi novamente muito ruim, o balanço geral deverá mostrar, quase certamente, uma retração econômica, mesmo com os dados positivos da agropecuária. A produção rural continua sendo uma exceção no cenário de ineficiência e de baixa competitividade da economia brasileira.Por seu peso estatístico na formação do PIB, o setor de serviços vinha compensando, no balanço geral, a estagnação da indústria. Do lado da demanda, o consumo privado também vinha sendo um foco de dinamismo, ao lado do gasto público. Mas os dois fatores - os serviços, do lado da oferta, e o consumo familiar, do lado da demanda - perderam vigor. Com isso, a desolação econômica se torna quase completa. Ficam fora somente o agronegócio e uns poucos segmentos da indústria, com destaque para a fabricação de aviões.Apesar de tudo, a maior elevação nominal (9,2%) foi a da receita dos serviços prestados às famílias. Mas o crescimento real ficou abaixo de 1%. Um resultado melhor que esse em 2015 será uma surpresa, se as expectativas de mais um ano de baixa atividade se confirmarem. No mercado, a mediana das projeções de crescimento econômico em 2015 ficou em menos 0,5% na pesquisa Focus do dia 20. Nessa pesquisa, cada semana o Banco Central consulta uma centena de instituições.O enfraquecimento do setor de serviços combina com os dados da produção industrial e das vendas do comércio varejista publicados nas últimas semanas pelo IBGE. A indústria produziu no ano passado 3,2% menos que em 2013, de acordo com esse balanço. Mas a produção industrial já vinha diminuindo nos anos anteriores, principalmente por causa dos erros de política econômica acumulados nos últimos anos.A perda de vigor do consumo, no entanto, marcou uma alteração da tendência observada durante vários anos. Não chegou a ser uma surpresa, porque a inflação elevada e persistente, o crédito mais seletivo e o menor dinamismo do mercado de empregos deveriam afetar a disposição dos consumidores. Faltava saber quando o efeito desses fatores se tornaria bastante visível. De toda forma, a desaceleração do consumo foi notada no segundo semestre de 2014. No ano, as vendas do varejo "ampliado", isto é, com inclusão de veículos, autopartes e material de construção, foram 1,7% menores que as de 2013. As do varejo restrito ainda aumentaram 2,2%, um resultado modesto.O enfraquecimento da oferta de serviços acompanhou a retração geral da demanda. O investimento produtivo declinou nos últimos anos e a exportação fraquejou. Os dois fenômenos foram em boa parte associados ao mau desempenho da indústria e à lenta realização dos projetos de infraestrutura. Os números comprovam, enfim, cada vez mais claramente, a tese proclamada há muito tempo pelo bom senso: é impossível manter por muito tempo uma atividade econômica baseada no consumo e em serviços de baixa produtividade. Mas o governo recusou, durante anos, essa obviedade.