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Copom inerte, meta sem prazo

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Por Redação
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A inflação continuará acima da meta - 4,5% - pelo menos até o fim do próximo ano, segundo projeção do Banco Central (BC). Apesar disso, a elevação dos juros foi interrompida e a taxa básica, a Selic, foi mantida em 11% na última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), na quarta-feira da semana passada. A projeção aparece na ata dessa reunião e confirma, sem surpresa, a expectativa corrente de fortes pressões inflacionárias ainda por muito tempo. A ata contém a estranha promessa de medidas para "assegurar a convergência tempestiva da inflação para a trajetória de metas". Qual será, para os membros do Copom, o significado de "tempestiva"? No melhor português, essa palavra indicaria uma convergência oportuna, "no tempo devido". Essa é a definição do Novo Aurélio. Para a autoridade monetária, o "tempo devido" só chegará depois de mais um ano e meio, talvez dois, talvez mais - quem pode saber?Não há, na ata, um único argumento sério e passavelmente articulado em defesa da interrupção da alta de juros. A mera referência aos efeitos incompletos do aperto monetário iniciado em abril de 2013 é inconvincente. Essa menção apareceu em documentos anteriores. A inflação, nos meses seguintes, continuou resistente e longe da meta, porque os efeitos esperados nunca apareceram. Ou estariam começando a surgir, como afirmaram recentemente alguns analistas?Os membros do Copom parecem pouco dispostos a levar a sério essa hipótese. A ata menciona um declínio recente da inflação mensal, mas a aposta na melhora do quadro é muito modesta. Se o BC estivesse de fato confiante, projetaria inflação tão alta ainda por tanto tempo?No mercado financeiro, a interpretação dominante, depois da ata, foi a mesma da semana anterior: a decisão de manter os juros foi motivada principalmente pela percepção do mau estado da economia. Segundo a ata, "o ritmo de expansão da atividade doméstica tende a ser menos intenso este ano" que em 2013. O consumo "tende a crescer em ritmo mais moderado" que nos últimos anos e o investimento deve "ganhar impulso". O BC estaria, portanto, cumprindo um duplo mandato, como o americano Federal Reserve (Fed), e sua prioridade, agora, seria evitar uma deterioração maior da economia.Essa interpretação parece fazer sentido. Mas uma opinião menos gentil e mais compatível com o desempenho do Copom nos últimos três anos vincularia a decisão de 28 de maio aos objetivos eleitorais da presidente Dilma Rousseff e de seu partido. A ação do BC, nesse caso, estaria de acordo com a tolerância à inflação característica do governo petista e ajudaria a presidente em seu esforço de manter ou reconquistar o apoio de empresários.Além do mais, a ata menciona uma porção de motivos de preocupação para quem conduz a política monetária. A demanda geral da economia "tende a se apresentar relativamente robusta", com o consumo familiar ainda estimulado pelo aumento da renda e pela "expansão moderada do crédito". O mercado de trabalho continua apertado e "a dinâmica salarial permanece originando pressões inflacionárias de custos". A inflação se mantém resistente, alimentada também pelo realinhamento dos preços domésticos "em relação aos internacionais" dos "administrados em relação aos livres".A expectativa mais otimista, a melhora das condições fiscais, é apresentada, no parágrafo 23, em linguagem condicional. Um resultado mais favorável das contas públicas "contribuiria" para "arrefecer o descompasso entre as taxas de crescimento da demanda e da oferta", etc. A palavra "contribuiria" é usada três vezes no parágrafo. De fato, contas públicas em melhor estado seriam uma boa contribuição para a política anti-inflacionária. Mas quem acredita nessa possibilidade, neste ano?Mas o maior desafio para o leitor da ata é interpretar o fim do parágrafo 26: "Além disso, é plausível afirmar que, na presença de níveis de confiança relativamente modestos, os efeitos das ações de política monetária sobre a inflação tendem a ser potencializados". Então é isso e estamos conversados.