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Opinião|Crescimento agrícola e do PIB em 2017

O desenvolvimento do País pode ser alcançado pela cadeia de produção da proteína animal

Atualização:

“A produção de grãos no Brasil vai crescer 28% em 2017; pena que represente somente 5,5% do PIB nacional.” Esse tipo de comentário é contumaz entre os chamados “analistas” econômicos: é como se o boi desaparecesse ao ultrapassar as cercas das fazendas. Esquecem eles que a manada prossegue em direção aos frigoríficos (indústrias) e aos açougues e restaurantes (transportes e varejo), agregando, em média, 20% nas fazendas, 15% nas indústrias e 65% no comércio e nos transportes. Mas continua boi!

Esse boi e outros 37 produtos com origem na agricultura representaram 56% do PIB global em 2013, quando medido por “produtos finais”, isto é, seus valores finais no varejo e nas exportações. Essa técnica, embora recomendada em todos os livros-texto de economia, não é normalmente usada pelos institutos de cálculo de produto interno bruto (PIB) em quase todo o mundo. Sabe-se lá por quê! Nada de errado, entretanto: ao levantar os dados e divulgá-los, permite-se uma visão diferente da normalmente levada ao público, de PIB por valor agregado: setor primário (agricultura e mineração), setor secundário (indústrias de transformação e construção civil) e setor terciário (comércio e serviços). Os números do PIB têm de ser iguais, qualquer que seja a técnica.

O crescimento extraordinário da produção de grãos neste ano de 2017 representa 1) recuperação da quebra de safra, por causa do clima, de 10% em 2016 e 2) retorno ao vigoroso crescimento global a partir de 2002-2003, quando a China e outros países asiáticos entraram firmes no mercado internacional como compradores, flexionando para cima os preços em cerca de 80%-100%, depois de três décadas de quedas contínuas. O agronegócio com um todo respondeu a esses aumentos de preços e puxou toda a economia entre 2003-2014, quando então esses mesmos preços sofreram queda de 30%-40%, invertendo o passo nos anos 2015-2016. Mesmo a preços menores que em 2013-2014, mas maiores que em 2002-2003, nossa agricultura voltou a crescer em 2017, a taxas jamais registradas na História. “Pena que represente só 5,5% da economia”!

Os anos de 2015-2016 foram péssimos para a nossa economia: preços agrícolas em baixa, investimentos industriais e de infraestrutura retraídos por desmandos éticos, certa saturação no consumo de bens duráveis, grave instabilidade política, tudo isso levando aos maiores níveis de desemprego da História recente. Neste momento de agitação entre os “analistas”, formulando prognósticos para o nosso desempenho econômico em 2017, julgamo-nos com autoridade para também fazer os nossos.

A sociedade em geral, urbana por excelência, ignora, na sua maioria, que os grãos de milho e soja – 80% do total – não são produzidos para se consumirem em festas de São João nem como óleo de cozinha, somente! São para produzir proteína animal – carnes de porco e de aves, ovos, leite e, parcialmente, carne bovina, dentre os alimentos mais nobres e caros da dieta humana. Esse aumento de 28% na produção de grãos, portanto, vai produzir mais proteína animal no Brasil e no exterior. E a agregação de valores ao longo da cadeia será proporcional ao incremento físico e monetário dos grãos. Essa proteína, produzida a partir dessa fantástica dupla caipira, é o carro-chefe do nosso agronegócio e – por que não dizer? – da nossa economia.

Sim, porque, em nossa pesquisa de 2013, o conjunto dos produtos de proteína animal representou 26% de todo o PIB nacional naquele ano, superior a grupos de bens industriais não agrícolas, até então hegemônicos. Podemos, pois, inferir que o crescimento de 28% dos grãos este ano vai desencadear um crescimento global que poderá superar os 10%, medido pelo PIB corrente deflacionado pelo IPCA (o PIB privado é constituído por 80% de bens e serviços de consumo e 20% de bens de capital).

Esse resultado, todavia, não se faz sentir nos primeiros meses do ano, quando só parte da primeira safra está colhida e não necessariamente comercializada. A segunda safra é colhida entre maio e julho e sua comercialização, em mais três meses em média. A transformação de grãos em carnes leva mais três, quatro meses e sua comercialização, outro tanto. Portanto, a renda da cadeia agrícola só se completa no segundo semestre do ano gregoriano e se estende no ano entrante, que é o ciclo a ser considerado para movimentar todas as cadeias produtivas.

A Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) montou interessante índice de desenvolvimento municipal (IFDM), de extrema validade para comparar desenvolvimentos regionais. Por ele os municípios brasileiros são classificados em quatro faixas, com escores de zero a um, e os mais desenvolvidos estão com notas acima de 0,8. Somente 430 alcançam esse índice máximo, ou 7,8% dos 5.517 municípios brasileiros pesquisados, a maioria em São Paulo.

No Estado de Goiás, fora a capital, Goiânia, cinco municípios estão nesse grupo: Catalão, Rio Verde, Jataí, Itumbiara e Chapadão do Céu – todos no sul do Estado. Catalão tem uma indústria automobilística – Mitsubishi – e os outros quatro têm soja, milho e a cadeia de proteína animal.

Conclusão: o sonho de desenvolvimento brasileiro pode perfeitamente ser alcançado pela cadeia de produção da proteína animal, e por aí há muito a ser explorado, pelo enorme potencial produtivo local e por um mercado externo guloso – o Brasil consome 85 kg per capita de carnes, o mesmo nível europeu, enquanto a China consome 55 kg e a Índia, 5 kg. Cada quilo a mais consumido por estes dois países representará 2,5 milhões de toneladas num comércio externo 8,5 milhões.

O caminho é por aí, independentemente dos malfeitos de uma ou outra empresa do ramo.

*Respectivamente, ex-ministro da Agricultura, presidente do Fórum do Futuro; embaixador, ex-ministro

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