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Crise interna e conta externa

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Por Redação
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O desemprego, a perda de renda, o dólar caro e a insegurança dos brasileiros estão reduzindo o apetite por bens importados e a disposição de viajar ao exterior. O mau estado da economia nacional tem produzido alguma melhora nas contas externas. Qualquer outra explicação para essa melhora seria fantasiosa, porque a maior parte da indústria continua incapaz de competir e os preços dos produtos básicos têm caído. Graças à estagnação, o buraco na conta corrente do balanço de pagamentos ficou em US$ 6,9 bilhões em abril e US$ 32,46 bilhões nos primeiros quatro meses de 2015. Os números correspondentes foram bem mais altos no ano passado, quando o déficit bateu em US$ 9,19 bilhões em abril e chegou a US$ 37,07 bilhões no quadrimestre. Apesar disso, os grandes números continuam feios, segundo os últimos dados do Banco Central (BC). O rombo na conta corrente atingiu US$ 100,22 bilhões nos 12 meses terminados em abril, soma equivalente a 4,53% do Produto Interno Bruto (PIB), uma proporção preocupante.

O investimento direto no País, nesses 12 meses, ficou em US$ 86,07 bilhões, ou 3,89% do PIB, e foi insuficiente para cobrir o buraco das transações correntes. Esse tipo de dinheiro é destinado diretamente à atividade empresarial. É o mais produtivo e mais seguro. Para fechar a conta, o País dependeu, portanto, de outros tipos de financiamentos, menos estáveis e muito mais especulativos. Já em 2014 o investimento direto ficou abaixo do necessário para fechar a conta. Não faltou dinheiro, mas a qualidade do financiamento foi menos satisfatória que em anos recentes.

O cenário do balanço de pagamentos deve continuar preocupante nos próximos meses. Pelas projeções do BC, o déficit em conta corrente ficará em US$ 84 bilhões neste ano, ou 4,42% do PIB estimado para 2015. Em 2014, chegou a US$ 104,83 bilhões, ou 4,47% do PIB. O investimento direto deve alcançar 4,21% (no ano anterior, 4,13%). Os cálculos embutem a expectativa de uma redução de cerca de 19% no valor do PIB em moeda americana, de US$ 2,34 trilhões para US$ 1,9 trilhão, aproximadamente. Se confirmada, essa mudança resultará da combinação da esperada contração econômica e da desvalorização do real.

As transações correntes incluem o comércio de bens, a conta de serviços (onde entram, por exemplo, viagens, transportes e aluguéis de equipamentos), a de renda primária (salários, juros, lucros e dividendos enviados e recebidos) e a de renda secundária (transferências unilaterais, como as remessas de trabalhadores no exterior). Pelas contas do BC, o déficit comercial diminuiu de US$ 6,34 bilhões no período janeiro-abril do ano passado para US$ 5,83 bilhões nos primeiros quatro meses deste ano. A melhora é explicável principalmente pela redução das importações, de US$ 75,48 bilhões para US$ 63,62 bilhões. A receita deste ano ficou em US$ 57,79 bilhões, com redução de 16,42%. A diminuição do déficit de serviços, de US$ 14,65 bilhões para US$ 13,78 bilhões, é atribuível em boa parte à queda dos gastos com viagens ao exterior. Também na conta de rendas houve alguma melhora.

A economia brasileira, já muito fechada, teve menor participação no mercado global em 2014 e continua, em 2015, perdendo contato com o mundo exterior. As projeções do BC indicam maior retração das operações internacionais até o fim do ano. As exportações de bens estão estimadas em US$ 210 bilhões, com recuo de 6,5% em relação ao ano passado. As importações devem cair US$ 10,35%, para US$ 207 bilhões. O saldo passará de um déficit de US$ 6,25 bilhões para um superávit de US$ 3 bilhões. A melhora resultará da contração das importações, porque o valor exportado também cairá. Com isso, a corrente de comércio cairá mais uma vez. O Brasil segue rumo oposto ao das economias mais dinâmicas, cada vez mais integradas no comércio global e na cadeia internacional de formação de valor. Inverter essa tendência será uma das tarefas mais importantes da equipe econômica. Será preciso mudar amplamente a política e buscar mais produtividade e menos protecionismo.

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