Imagem ex-librisOpinião do Estadão

Da moradia à recuperação

Pacote de estímulos à construção de moradias poderá servir como impulso à retomada do crescimento

Exclusivo para assinantes
Por Redação
2 min de leitura

O novo pacote de estímulos à construção de moradias, lançado nesta semana pelo presidente Michel Temer, poderá servir como impulso – um dos muitos necessários – à retomada do crescimento, depois de mais de dois anos de recessão. Ao anunciar a ampliação de financiamentos ao programa Minha Casa, Minha Vida, o presidente mencionou a criação de empregos como um dos benefícios prováveis dessa iniciativa. Esse objetivo, sempre importante numa economia em desenvolvimento, se torna dramaticamente relevante quando se estimam em 12,3 milhões os desempregados. A preocupação com a abertura de vagas, afirmada também pelo ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, é mais que justificável. Mas a maior oferta de postos de trabalho será apenas um dos efeitos, certamente um dos mais benéficos, da reativação de vários setores produtivos. O sucesso dependerá, naturalmente, de vários fatores, a começar pela execução competente e ágil das medidas necessárias à implantação dos incentivos. 

As inovações prometidas são basicamente simples. A renda máxima do beneficiário passará de R$ 6,5 mil para R$ 9 mil mensais. Os valores dos imóveis financiáveis também subirão, com limites diferentes de acordo com a localização. Sem abandonar os grupos de renda mais baixa, alvos iniciais do programa lançado em 2007, o governo dará mais atenção a uma camada de renda média. Está prevista a contratação de 610 mil moradias neste ano. A maior parte desse total – 400 mil unidades – será destinada às faixas 2 e 3, com renda mensal entre R$ 4 mil e R$ 9 mil. Se o foco nessas famílias apressar a dinamização do programa, a inovação estará mais amplamente justificada por seu efeito estratégico. 

A construção civil é especialmente importante para o crescimento econômico, por suas conexões com os demais setores da produção. A construção habitacional depende de um vasto conjunto de insumos, produtos de aço, cimento, cerâmica, vidro, louça, alumínio, cobre, plásticos e madeira. Envolve, além disso, o uso de equipamentos mecânicos. Concluída a obra, o uso da moradia depende de móveis, eletrodomésticos e diversos artigos têxteis. Toda essa teia de produção foi severamente afetada pelo desemprego e pelo enfraquecimento das vendas imobiliárias e da construção civil. 

As contas nacionais do terceiro trimestre, as últimas disponíveis, mostram os efeitos setoriais da recessão. No período de julho a setembro, a produção da indústria geral foi 2,9% menor que a de igual período de 2015. No caso da construção, o recuo chegou a 4,9%, resultado tanto da crise das grandes obras como do arrefecimento da produção habitacional. No acumulado de 2016 até setembro, a atividade da construção foi 4,4% menor que nos meses correspondentes de 2015. Nessa comparação, o desempenho da indústria de transformação foi bem pior, com retrocesso de 6,9%. Mas é preciso levar em conta os vínculos entre a construção e a indústria de transformação, para ter uma ideia mais clara do desastre. 

Embora as contas do trimestre final só devam estar fechadas no próximo trimestre, um primeiro balanço anual da indústria já foi preparado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Segundo esse balanço, em 2016 a indústria geral produziu 6,6% menos que no ano anterior. O recuo da indústria de bens de capital – máquinas e equipamentos – chegou a 11,1%. O subsetor de bens de capital para construção encolheu, no entanto, 16,6%, em mais uma confirmação do desastre ocorrido em todos os tipos de obras. 

A indústria de bens intermediários também foi muito mal, com uma produção 6,3% inferior à de 2015. O pior desempenho foi o dos fornecedores de insumos para construção, com recuo de 11,8% durante o ano.  Esses números devem dar uma ideia dos benefícios possíveis de um impulso à construção. O efeito se espalhará por outros segmentos, favorecendo a produção e a oferta de vagas. Esse impulso será multiplicado, porém, se o governo movimentar o setor de infraestrutura. Mas a tarefa, nesse caso, deve ser mais complicada.