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Decisão que exige cautela

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Por Redação
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Paira sobre as finanças públicas, em todos os níveis, a ameaça de uma sangria de recursos para o pagamento aos servidores de indenizações que, segundo funcionários civis do Estado de São Paulo, estariam previstas na Constituição, mas não teriam sido pagas regularmente. O caso pode ter grande impacto financeiro para todo o setor público, pois está sendo julgado no Supremo Tribunal Federal (STF) pelo mecanismo de repercussão geral, ou seja, apresenta uma questão que, por seu interesse político, econômico ou social, ultrapassa os limites dos interesses de seus autores e do governo paulista. A decisão valerá para outros processos semelhantes que aguardam decisão da Justiça.Os servidores de São Paulo tiveram rejeitado pelo Tribunal de Justiça do Estado seu pedido de indenização por reajustes salariais que consideram estar assegurados na Constituição e decidiram apresentar recurso extraordinário ao STF.O pedido tem como fundamento o artigo 37 da Constituição, que, no inciso X, assegura a "revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices" da remuneração dos servidores. Parece claro que, ao determinar a "revisão" anual, o texto não obriga o governo a corrigir anualmente os vencimentos, de modo a repor a perda de poder aquisitivo provocada pela inflação.No entanto, o ministro Marco Aurélio considerou que a não correção dos salários de acordo com a inflação, ao reduzir o poder aquisitivo do servidor, fere outra disposição constitucional, a da irredutibilidade dos vencimentos, estabelecida no inciso XV do mesmo artigo. No entendimento do ministro, por não se tratar de aumento de remuneração, mas apenas de correção - ou "reajuste voltado a afastar os nefastos efeitos da inflação" -, a medida dispensa a aprovação de lei específica para isso. Os ministros Carmen Lúcia e Luiz Fux votaram no mesmo sentido.O ministro Luís Roberto Barroso, porém, divergiu dessa interpretação. A seu ver, a Constituição não impõe o dever de aumentar anualmente os vencimentos dos servidores nem a aplicação de um porcentual que corresponda à inflação apurada num determinado período, pois revisão não significa modificação. Ou seja, o poder público é obrigado a rever anualmente os salários dos funcionários, mas não está obrigado a aumentá-los todos os anos. É o Poder Executivo que deve decidir sobre a conveniência e a possibilidade de concessão de reajuste geral anual para o funcionalismo. Acompanharam o voto de Barroso os ministros Teori Zavascki, Rosa Weber e Gilmar Mendes.Pedido de vista do ministro Dias Toffoli adiou a decisão. Trata-se do terceiro adiamento desde junho de 2011, quando o ministro Marco Aurélio emitiu seu voto favorável aos servidores. Na sessão em que Toffoli pediu vista, o ministro Gilmar Mendes recomendou "imensa cautela", pois não se julgava um caso isolado. "Estamos a emitir um juízo que dirá que todos os servidores federais, estaduais e municipais farão jus, à guisa de uma indenização, e certamente com efeito retroativo, a um valor de reajuste."Não foram apresentadas estimativas do impacto que uma decisão favorável aos funcionários poderá ter sobre as contas da União, dos Estados e dos municípios. Com certeza não seria pouco dinheiro. O advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, ocupou a tribuna do STF para informar que um reajuste de 1% na folha de salários da União implica gastos adicionais de R$ 2,3 bilhões por ano (seu cálculo se baseia em valores de 2012). Pode-se, por esse dado, ter uma ideia de quanto o contribuinte seria onerado, se os salários de todos os funcionários públicos do País fossem automaticamente corrigidos pela inflação passada, com efeito retroativo para os casos dos servidores que não tiveram essa correção no passado.Além disso, uma decisão favorável aos servidores reindexaria todos os vencimentos pagos pelo setor público, destruindo um dos pilares do Plano Real, que teve efeitos positivos sobre a renda de todos os brasileiros. Daí a importância de os ministros que ainda não votaram decidirem com cautela.