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Déficit e fragilidade

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Por Redação
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Com um buraco de US$ 84 bilhões projetado para o ano, as contas externas continuarão refletindo, em 2015, as fraquezas da economia nacional - especialmente o baixo poder de competição da indústria brasileira. Os otimistas poderão apontar uma recuperação. O resultado final do ano passado foi um déficit de US$ 103,98 bilhões na conta corrente do balanço de pagamentos, segundo os novos cálculos do Banco Central (BC). Mas a melhora de cerca de US$ 20 bilhões deverá resultar, em boa parte, de um encolhimento das transações internacionais, um dos sintomas de um país muito debilitado. Os mais claros sinais de enfraquecimento têm aparecido, e continuarão a aparecer, segundo as novas previsões, na balança comercial, isto é, no intercâmbio de bens. O valor projetado para as exportações, de US$ 210 bilhões, é 6,5% menor que o total do ano passado (US$ 224,64 bilhões). O gasto estimado com as exportações, de US$ 207 bilhões, é 10,35% inferior ao de 2015. O saldo comercial passará de um déficit de US$ 6,25 bilhões para um superávit de US$ 3 bilhões, mas essa mudança não indicará uma retomada do dinamismo nas operações internacionais.A redução das compras, se confirmada, será em grande parte explicável pela retração da demanda interna. A soma de exportações e importações - a corrente de comércio - ficará em US$ 417 bilhões, 8,47% abaixo do valor contabilizado para 2014, de US$ 455,58 bilhões. Os novos dados e projeções do balanço de pagamentos são baseados em novos critérios de organização e cálculos das contas externas. A adoção dos novos padrões pelo BC atende a uma recomendação do Fundo Monetário Internacional (FMI) e facilitará a comparação das contas brasileiras com as de outros países. A metodologia recém-adotada permite, segundo seus defensores, maior precisão e maior clareza na apresentação das transações externas. Há mudanças em todos os grupos de transações componentes do balanço de pagamentos - as contas de mercadorias (balança comercial), de serviços, de rendas, de capitais e financeira. A conta de mercadorias, por exemplo, passa a incorporar as exportações e importações de eletricidade, classificada como um bem. Mas o quadro geral das mudanças é amplo e às vezes complexo. Pelos novos cálculos, o saldo comercial do primeiro trimestre foi um déficit de US$ 6,11 bilhões. Pelo método tradicional, ainda seguido pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic), o déficit dos primeiros três meses ficou em US$ 5,56 bilhões. Também pelo critério do Mdic, o saldo negativo pouco mudou durante o mês e o acumulado no ano até a terceira semana de abril chegou a US$ 5,66 bilhões. Não há, no entanto, explicação para a divergência nas contas trimestrais no relatório recém-divulgado pelo BC.O novo critério resultou em alguma alteração nos detalhes e em alguns números, mas a tendência indicada pelas cifras é a mesma apontada pelas contas tradicionais. A receita comercial deste ano será prejudicada pela desvalorização de produtos básicos exportados pelo Brasil. É uma espécie de castigo pela excessiva dependência das commodities. Essa dependência resulta principalmente de dois fatores: a desastrosa diplomacia comercial do governo petista e a política industrial em vigor a partir do segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A diplomacia condenou o Brasil a jogar nas divisões inferiores do comércio e dispensou a indústria de buscar produtividade e inovação e de se integrar nas cadeias de valor. A política industrial complementou a estratégia com protecionismo anacrônico e debilitante. Para mudar o quadro será preciso restabelecer a competitividade industrial, um passo além do indispensável ajuste das contas públicas e da redução da inflação a níveis civilizados. Nesse quadro, o déficit em conta corrente permanece elevado - bateu em 4,54% do PIB nos 12 meses até março - e continuará muito alto até o fim de 2015. O investimento direto continuará insuficiente para cobri-lo e o fechamento das contas continuará a depender de recursos menos estáveis e seguros.