Imagem ex-librisOpinião do Estadão

Derrota sem surpresa na OMC

Os programas da fase petista, iniciados no governo Lula, foram ainda mais claramente contrários às normas aceitas do comércio internacional

Exclusivo para assinantes
Por Redação
2 min de leitura

Acusado de ampla violação de regras internacionais, o Brasil foi condenado na Organização Mundial do Comércio (OMC) em processo contra sete de seus programas industriais, criados quase todos no período petista. O governo brasileiro anunciou a intenção de recorrer ao órgão de apelação da entidade. Ganhará tempo, com isso, para completar as mudanças políticas necessárias. Qualquer outra vantagem, se alguma for obtida, deverá ser muito limitada. Iniciado em 2013 pela União Europeia, o processo foi apoiado oficialmente por 13 outros países, incluídos Argentina, Colômbia, Estados Unidos e Japão. Não houve surpresa na derrota brasileira. O risco de condenação foi apontado várias vezes, durante anos, por especialistas do mercado e comentaristas da imprensa.

O mais velho dos programas, o da Lei de Informática, implantado em 1991, vigorou por um período notavelmente longo. Os programas da fase petista, iniciados no governo Lula, foram ainda mais claramente contrários às normas aceitas do comércio internacional. Além disso, foram baseados em critérios de política industrial anacrônicos, superados nos anos 1970 e 1980 na maior parte das economias mais dinâmicas e empenhadas na disputa de mercados. Dois instrumentos condenados pela OMC já estão desativados: o Programa de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da Indústria de Equipamentos para TV Digital (PATVD) e aquele instituído pela Lei de Inclusão Digital. Outros deveriam ser extintos ou reformulados, para se ajustar a um padrão de economia mais aberta, mais voltada para a busca de produtividade e menos dependente de subsídios. A substituição do Inovar-Auto por um programa de apoio setorial sem cotas de importação já estava planejada como parte dessa mudança.

Mas a violação de regras internacionais é só um dos defeitos da política industrial brasileira. Discriminação entre empresas produtoras e importadoras, imposição de cotas de importação e exigência de conteúdo nacional ou de desempenho exportador expõem o País a contestações legais e, no limite, a ações de retaliação. Esse risco é muito relevante, mas é preciso levar em conta outras questões, de repercussão principalmente interna. Os programas condenados envolvem enormes custos fiscais, com renúncias, só neste ano, de cerca de R$ 6,8 bilhões. Os incentivos concedidos a partir de 2010 podem ter custado cerca de R$ 25 bilhões. Quais os benefícios produzidos por tão grande generosidade em relação a alguns setores?

Apesar de tanto dinheiro canalizado a indústrias selecionadas, o Brasil aparece há muito tempo em posições muito ruins nas comparações internacionais de competitividade. O baixo poder de competição é explicável por vários fatores. O protecionismo é um deles.

Empresas protegidas pouco se esforçarão para inovar e para ganhar eficiência enquanto forem defendidas por barreiras comerciais. Incentivos fiscais são insuficientes para mudar esse quadro. Apesar dos subsídios, boa parte da indústria brasileira tem-se limitado a exportar para poucos mercados, principalmente da região. O crescimento industrial já era baixo antes da recessão iniciada no fim de 2014.

Parte dos subsídios, lembrou um empresário, foi criada para compensar defeitos do sistema tributário. A afirmação é bem fundada, mas nem por isso os programas se justificam. Se a tributação é disfuncional, como claramente é o caso, a solução correta é reformá-la. Não se compensam grandes distorções com remendos. Ao contrário: criam-se outros problemas e ainda se ampliam as injustiças na distribuição de encargos e de benefícios.

Mas a história é ainda mais feia. Políticas de proteção e de favores fiscais tendem a alimentar relações obscuras entre empresas e governo. Bandalheiras como aquelas mostradas pela Operação Lava Jato ocorrem menos facilmente em ambientes menos afetados por protecionismo, subsídios e políticas de conteúdo nacional. Quanto mais arejado o ambiente, mais trabalhoso é o disfarce e menor tende a ser a farra com recursos públicos.