Imagem ex-librisOpinião do Estadão

Desinteresse dos europeus

Exclusivo para assinantes
Por Redação
2 min de leitura

Cansada de esperar propostas aceitáveis, a União Europeia (UE) retirou de sua lista de assuntos prioritários as negociações do acordo de livre-comércio com o Mercosul. Dos temas comerciais relevantes a que o bloco europeu dedicará atenção neste ano fazem parte as negociações de acordos com os Estados Unidos e países da Ásia e o aprofundamento das relações com Geórgia, Moldávia, Ucrânia, Canadá e Cingapura, como mostrou o Estado em reportagem do correspondente em Genebra, Jamil Chade. O Mercosul não é mencionado. Não se trata de desprezo ou desfeita aos países do Cone Sul. Talvez seja simples cansaço com a demora dos países integrantes do Mercosul - Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai e Venezuela - em se entender a respeito de uma proposta minimamente aceitável pelos europeus. Se for isso, sua decisão está plenamente justificada. Afinal, as negociações entre os dois blocos para a celebração de um acordo de livre-comércio foram lançadas em 1999. Pouco se avançou desde então. Entre 2004 e 2010, as negociações ficaram totalmente bloqueadas, sem nenhuma iniciativa das partes. Foram retomadas em 2010, tendo sido realizadas diversas reuniões para a discussão de temas como acesso a mercado de bens, defesa comercial, solução de controvérsia, concorrência, investimentos, serviços, barreiras técnicas e sanitárias, entre outros, informa o Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Em 2014, os entendimentos pareciam evoluir, com o compromisso dos países do Mercosul de apresentar proposta conjunta do grau de abertura de seus mercados para bens e serviços europeus. Não têm faltado discursos e declarações de autoridades europeias e brasileiras a respeito da necessidade de concluir os entendimentos, para afinal assinar o acordo que, indiscutivelmente, beneficiaria as duas partes, estimulando o comércio e a integração entre elas. O interesse da União Europeia no estreitamento das relações com os países latino-americanos é evidenciado pelo fato de o bloco já possuir acordos de livre-comércio com 11 dos 19 países da região. Com os acordos, os países latino-americanos têm mais oportunidades de acesso a um dos maiores mercados do mundo. Na falta de acordo com o Mercosul, a UE fica sem acesso facilitado a países que respondem por cerca de 60% do PIB latino-americano. Dirigentes europeus em passagem pelo Brasil nos últimos meses enfatizaram a importância da conclusão do acordo entre o Mercosul e a UE. Em junho do ano passado, a chanceler alemã, Angela Merkel, por exemplo, garantiu que "nós temos muito interesse" em alcançar um acordo entre os dois blocos e, após encontro com a presidente Dilma Rousseff, garantiu: "Farei o que for possível para que possamos avançar e superar os obstáculos". No mês seguinte, o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Durão Barroso, disse esperar que o movimento para a conclusão do acordo ocorresse ainda no ano passado. "O Mercosul e a União Europeia andam a namorar já há 15 anos", afirmou. "Não será altura de dar um passo em frente e dizer que 'sim'?" Ao mencionar a hipótese de um acordo direto da UE com o Brasil, Barroso identificou o grande obstáculo à conclusão dos entendimentos - a resistência de outro membro do Mercosul, a Argentina, à redução das tarifas de importação - e irritou o governo argentino. A oferta do Mercosul está em exame em Bruxelas, sede da União Europeia. Em fevereiro, o ministro do Exterior da Alemanha, Frank-Walter Steinmeier, disse - ao lado chanceler brasileiro, Mauro Vieira - que seu país tem interesse em acelerar as negociações e que "vamos tentar o possível para que o processo seja acelerado". Não parece ter tido êxito. O novo presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, da Letônia, tem outras preocupações. Isso deve retardar ainda mais o avanço das arrastadas negociações entre os dois blocos. O Brasil, amarrado às regras do Mercosul que o impedem de negociar acordos comerciais, vai perdendo oportunidades de obter acesso mais fácil a seus principais mercados e de ampliar suas exportações.