Imagem ex-librisOpinião do Estadão

E o povo paga a conta

Meio ano depois do encerramento dos Jogos, mesmo orgulhosos com a beleza e o sucesso das festas, os cariocas – e os brasileiros em geral – começam a perceber que nem tudo saiu como previsto: há restos a recolher e a pagar da festa

Exclusivo para assinantes
Por Redação
2 min de leitura

Quando a cidade do Rio de Janeiro venceu as candidaturas de Madri, Tóquio e Chicago e virou sede da Olimpíada de 2016, por escolha do Comitê Olímpico Internacional (COI), em Copenhague, na Dinamarca, houve indisfarçável euforia. Afinal, seria a primeira vez que a América do Sul sediaria os Jogos e ocorreriam no Brasil os dois maiores eventos do esporte mundial, pois o País também sediaria o Mundial de Futebol da Fifa.

A qualquer crítico que argumentasse contra o óbvio excesso de gastos para um país emergente em período muito curto, a reação inevitável era de que as despesas seriam assumidas por empresas privadas, ficando para o Estado apenas os gastos com o legado olímpico, as obras de mobilidade urbana. Meio ano depois do encerramento dos Jogos, mesmo orgulhosos com a beleza e o sucesso das festas, os cariocas – e os brasileiros em geral – começam a perceber que nem tudo saiu como previsto: há restos a recolher e a pagar da festa.

O primeiro exemplo é o da arena em que foi transformado o velho e majestoso gigante Maracanã, construído a toque de caixa para sediar a primeira Copa no Brasil, em 1950. Os grandes clubes do Rio tiveram de jogar em outros locais todas as suas partidas, enquanto o estádio era submetido a grandes reformas, e, agora que a organização da Rio 2016 o devolveu para uso, o panorama no que foi “o maior do mundo” é desolador. Construído pelo município, mas administrado pelo Estado, ele foi concedido a um consórcio de empresas capitaneado pela Odebrecht, encalacrada num processo de pagamento de propinas distribuídas em troca de favorecimento em obras. O Estado e os concessionários recusam-se a recebê-lo dos organizadores da Olimpíada, devido a seu deplorável estado. Enquanto as empresas tentam passar adiante a concessão ou devolvê-lo ao Estado, o abandono é tal que na segunda-feira passada, no último dos saques que têm sido ali feitos, ladrões levaram um busto do jornalista Mário Filho, que dá nome ao estádio, extintores, mangueiras e dois receptores de televisão.

Parte do conjunto arquitetônico, o tradicional ginásio do Maracanãzinho, que hoje “não tem dono”, não está sendo usado. Assim como outras duas arenas moderníssimas do Parque Olímpico, na Barra: estão às moscas. Segundo Arthur Repsold, presidente da GL Eventos, dona da Arena Rio (antiga HSBC), “não há demanda para uma arena, o que dirá para três”. A Arena Carioca (assim como o Velódromo e o Estádio de Tênis) precisa ser transformada em centro de treinamento, como outras instalações do local. Seria o modelo possível.

A solução dada para o impasse foi, como é de hábito neste País, enfiar a mão no bolso do contribuinte e assumir os elefantes brancos. No fim do ano, ao apagar das luzes da gestão de Eduardo Paes, que sempre vendeu a ilusão da parceria privada, o ministro do Esporte, Leonardo Picciani, assumiu a manutenção das duas arenas, do Centro Olímpico de Tênis e do Velódromo. Quanto a operação custará aos cofres públicos? Ninguém sabe. Nem o ministro, que garantiu que responderia à questão num prazo razoavelmente curto: um mês a partir da data da promessa, feita em 23 de dezembro.

A intenção da prefeitura era entregar a gestão dos equipamentos a uma parceria público-privada. Mas só uma empresa se interessou pelo negócio, a Sanerio, que, segundo os técnicos da prefeitura do Rio, não apresentou a segurança financeira necessária para assumir o negócio. O custo estimado da parceria seria de R$ 30 milhões por ano. Paes culpou a crise financeira e a troca de governo pelo desinteresse das empresas. A crise citada, corrupção desenfreada e gestões de qualidade e honorabilidade bastante discutíveis levaram o Estado do Rio de Janeiro à calamidade financeira. E a troca de Paes por Crivella na prefeitura em nada deveria alterar a atratividade da parceria público-privada nem justificar que o contribuinte brasileiro assuma os custos da manutenção dos equipamentos que não têm como ser usados após findas Olimpíada e Paralimpíada.