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Efeitos da safra menor

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Por Redação
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Responsável há anos por dar tranquilidade ao abastecimento interno de alimentos e, ao mesmo tempo, assegurar expressivos saldos no comércio exterior brasileiro, por meio de constante aumento da produção que evitou um arrefecimento ainda mais agudo da economia, a agricultura foi fortemente atingida por problemas climáticos. A produção de grãos da safra 2015/2016 deverá registrar queda de 5,4% em relação ao ciclo anterior. Isso significa uma redução de 11,1 milhões de toneladas no total a ser colhido, estimado em 196,5 milhões de toneladas pelo mais recente acompanhamento da safra de grãos realizado pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Esse resultado interrompe uma sequência de crescimento da produção iniciada na safra 2008/2009.

Não haverá riscos para o abastecimento, pois, mesmo com a diminuição em relação à safra anterior, a produção continuará muito alta. Embora possa haver queda em vários itens na comparação com a safra anterior, os estoques projetados para o final do ciclo dos produtos cuja cultura foi mais afetada pela escassez de chuvas e pelo excesso de calor estão em nível considerado confortável. Mas, de algum modo, a redução da produção de grãos será sentida pelos consumidores – não pela escassez, mas pelo preço.

O produto mais afetado pela adversidade do clima foi o milho, tanto da primeira como da segunda safras, prejudicadas pela estiagem prolongada e pelas altas temperaturas. A primeira safra deverá alcançar 26,2 milhões de toneladas, com queda de 3,9 milhões de toneladas. A segunda, que começa a ser colhida, deve ser 4,6 milhões de toneladas menor. No total, a produção de milho deve cair cerca de 10%, de 84,67 milhões de toneladas na safra 2014/2015 para 76,23 milhões de toneladas na atual.

Também a soja, responsável por praticamente a metade (48,7%) da produção nacional de grãos, teve sua safra prejudicada pelo clima, mas bem menos que a do milho. A queda da produção de soja deve ser de 0,6%. Isso afeta não apenas o preço da soja em grão; também ficaram mais caros o farelo e o óleo de soja.

Igualmente a produção de arroz, feijão e algodão deve recuar, por causa da redução da área plantada e das condições climáticas desfavoráveis. No caso do feijão, faltou chuva durante o plantio e houve excesso durante a colheita. Entre as culturas de inverno destaca-se o trigo, com produção de 5,88 milhões de toneladas, 6,3% maior do que a da safra anterior.

A combinação de aumento de 0,4% da área plantada (de 57,9 milhões de hectares para 58,2 milhões de hectares) e redução da produção resulta em queda da produtividade, outro efeito das dificuldades climáticas enfrentadas pelos produtores.

Seca no fim da safra do Nordeste brasileiro, problemas climáticos também na Argentina e dúvidas sobre o comportamento da futura safra dos Estados Unidos pressionaram os preços de importantes produtos agrícolas. Indicadores da inflação como o Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna (IGP-DI), da Fundação Getúlio Vargas, que captam com mais intensidade os preços no atacado, registram o impacto da alta dos alimentos há algum tempo. O IGP-DI de maio, por exemplo, registrou alta de 1,13%, bem acima da variação de abril (de 0,36%), impulsionado especialmente pelos preços no atacado e, entre esses, os dos produtos agrícolas, que subiram 3,31% no mês passado. É notável a aceleração da alta: o preço do milho em grão subiu 9,61% em maio (contra 6,62% em abril) e a soja em grão, 14,01% (contra 3,00% no mês anterior).

Ainda que mitigado, esse aumento no atacado chegará aos preços ao consumidor, pois os grãos que ficaram mais caros são insumos que afetam decisivamente o preço da ração para frangos, suínos e, em alguma medida, bovinos. Em algum momento, os preços das carnes serão afetados.

Os alimentos tiveram influência marcante na alta de 0,78% do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em maio e devem continuar a pressionar a inflação.