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'Em paz' com São Paulo

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Por Redação
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É de tal ordem o volume de recursos prometidos pelo governo federal para obras na capital paulista que o prefeito Fernando Haddad já fala, cheio de entusiasmo, na existência, ainda que informal, de um "PAC São Paulo", em alusão ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). No total, serão R$ 8,1 bilhões para serem aplicados na melhoria do transporte público, na recuperação de áreas de proteção de mananciais e em habitação. Se tudo correr como previsto, será muito bom para São Paulo, é claro, porque todos os setores contemplados são importantes. Isto é o que mais conta nesse caso. Mas não há como deixar de chamar a atenção para a evidente motivação política da medida que, além dos paulistanos, vai beneficiar também as ambições políticas da presidente e do prefeito. A presidente foi tão longe nesse caminho que, não contente de ajudar Haddad, ainda se permitiu fazer críticas veladas ao governador Geraldo Alckmin durante o anúncio das medidas. A maior parte dos recursos - R$ 3,3 bilhões - irá para a recuperação do entorno das Represas Billings e Guarapiranga, com obras de drenagem, pavimentação e instalação de equipamentos comunitários. Nessa parte está incluída também a construção de moradias, por meio do programa Minha Casa, Minha Vida, para 15 mil famílias que serão removidas das margens das represas. Um outro conjunto de projetos - de drenagem do Riacho Ipiranga e de vários córregos, entre os quais Paciência e Tremembé - consumirá R$ 1,6 bilhão.Mais R$ 3,1 bilhões serão aplicados em ambicioso programa de construção de 150 km de corredores de ônibus até 2016, ao custo estimado em R$ 4,2 bilhões, sendo a diferença coberta pela Prefeitura. Todos esses corredores terão espaço para ultrapassagem e pontos de parada a cada 600 metros.Duas observações se impõem a respeito desses projetos e da participação neles do governo federal. Uma, de ordem técnica, refere-se ao verdadeiro alcance dos corredores para a melhoria do serviço de ônibus. Embora permita transportar bem menos passageiros do que uma linha de metrô, um corredor tem sua importância porque custa muito mais barato e sua construção é mais rápida. Mas eles estão longe, por si sós, de serem a solução para o transporte coletivo, como afirma Flamínio Fichmann, especialista na questão.É preciso pensar também, diz ele, na criação de linhas de ônibus expressos e semiexpressos nos corredores e na há muito prometida reordenação das linhas. O que não é fácil, porque essa reordenação, importante para os usuários, pode contrariar os interesses das empresas, cujo poder de pressão é muito grande. Ou se faz isso "ou teremos só uma bonita obra de engenharia", adverte Fichmann.A outra observação, de ordem política, refere-se ao favorecimento da presidente a um governante aliado, tão evidente que Haddad se traiu ao dizer que São Paulo está fazendo as pazes com o governo federal. Não havia paz, então, quando o prefeito não era petista? Mas lamentável mesmo foi a presidente aproveitar a ocasião para fazer política miúda, atacando a administração tucana do Estado, embora sem citar nomes. São Paulo, disse ela, é talvez "a maior cidade do mundo com o menor sistema de transporte metroviário do mundo".Que o sistema é acanhado, longe de corresponder às necessidades, não há dúvida. Mas é igualmente certo que a União, neste e em outros governos, ajudou quase nada na construção do sistema, como lembrou a Companhia do Metrô, em resposta à presidente: "O governo federal se limita a emprestar para o governo estadual dinheiro que será pago com impostos dos contribuintes". A presidente Dilma Rousseff pode facilmente, se quiser, desfazer a má impressão que causou e mostrar que aplica com imparcialidade o dinheiro público. Basta dar ao pedido de ajuda do governador Geraldo Alckmin para projetos de expansão do metrô, de reforma da CPTM e de construção de um corredor de ônibus na região de Campinas a mesma atenção que deu às reivindicações de Haddad.