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Opinião|Estratégia – inclusão social

Atualização:

A inclusão social vem principalmente do trabalho em condições humanamente decentes. Com grande e crescente população, é preciso que no Brasil as oportunidades de trabalho venham em grande número, até mesmo para reduzir bastante o enorme e também crescente contingente de desempregados.

A taxa média de desemprego nas seis maiores regiões metropolitanas do País estava perto de 7% da população economicamente ativa no final de 2009 e até 2014 evoluiu favoravelmente, caindo para cerca de 4,5% no fim desse mesmo ano. Mas num único ano, 2015, ela voltou aos mesmos 7% de 2009!

As oportunidades de trabalho vêm essencialmente do crescimento econômico de um país, dado pelo aumento de sua capacidade produtiva utilizada, medida pela comparação do seu produto interno bruto (PIB) num ano com o do ano anterior. Nosso PIB de 2015 caiu 3,8% relativamente ao de 2014 e se prevê uma queda próxima da mesma magnitude em 2016. Que tombo!

Com essa queda se reverteu a inserção social de milhões de brasileiros. Imagine-se o leitor desempregado, com família para sustentar e muitas despesas a pagar. E com a situação agravada pela perda da autoestima num ambiente familiar em que olhares perplexos se entrecruzam sem saber como enfrentar dificuldades que se mostram insuperáveis.

As atividades econômicas e seus empregos integram um contexto cultural, político e institucional – este no sentido lato, de regras do jogo –, favorável ou não à sua expansão. Em artigos anteriores recorri a autores de renome internacional que desenvolveram esse enfoque. Hoje citarei dois que também abordaram a inclusão social: Daron Acemoglu e James Robinson. Em particular, escreveram um livro de mérito reconhecido (Por que as Nações Fracassam, Campus, 2012).

Segundo eles, “instituições econômicas inclusivas (...) permitem e encorajam a participação da grande massa de pessoas em atividades a que possam dedicar o melhor uso de seus talentos e habilidades, e que as credenciem a escolhas de seu interesse. (...) tais instituições devem prover segurança para a propriedade privada, um sistema legal sem distorções, e serviços públicos que forneçam um ‘campo de jogo’ num nível em que as pessoas possam fazer trocas e contratar; também devem permitir a entrada de novos negócios e que as pessoas possam escolher suas carreiras. (...) Instituições econômicas desse tipo estimulam a atividade econômica, o aumento da produtividade e o crescimento econômico. (...) e oportunidades econômicas não apenas para a elite, mas para amplos segmentos da sociedade” (páginas 74 e 75 de edição em inglês).

Nos cinco séculos pós-descobrimento o Brasil não cresceu economicamente o suficiente para se tornar um país rico, como os EUA e o Canadá, que nas Américas chegaram a esse status. O crescimento econômico, que às vezes até ocorreu com força, não se revelou inclusivo no sentido acima, nem teve sustentação, pois arrefeceu. Ou retrocedeu, como agora, deixando o Brasil mais para trás relativamente a países como os citados e muitos outros.

É sinal de que nossas instituições, nesse sentido lato de regras do jogo, não foram suficientemente estimulantes da atividade econômica. É preciso revê-las, em particular a estrutura do Estado e o papel de seus governos. Estes procuram estimular a economia, nem sempre com bons resultados. Ao contrário, o que fez o governo federal desde 2011 foi um conjunto de ações irresponsáveis que levaram a economia e sua população a prejuízos na faixa das centenas de bilhões de reais.

O caráter socialmente excludente do Brasil se evidenciou com mais força desde meados do século passado, quando o País tinha cerca de 50 milhões de habitantes. A população era predominante rural e na mesma área se concentrava a pobreza. Com a forte urbanização nas décadas seguintes, ela aflorou e demograficamente cresceu com força nas cidades, agravando seriamente problemas como criminalidade, imobilidade urbana e carência de serviços públicos. Educação, saúde e saneamento tampouco cresceram o suficiente em quantidade e qualidade.

Revelada pelo avanço das estatísticas e mesmo visualmente, a dívida social que veio do crescimento insuficiente e excludente é imensa, e também enorme a pressão nas urnas eleitorais por resgatá-la, o que está na raiz da chegada do petismo ao poder. Contudo, na sua ânsia de atender rapidamente a reclamos legítimos, mas obcecado em continuar no poder e a mamar nas suas tetas, ele se guiou por uma gestão incompetente e eticamente escandalosa, levando o Brasil ao imenso desastre atual.

O que fazer? Sem crescimento econômico não há salvação. Só ele pode gerar a autêntica inclusão social, via empregos, e prover recursos tributários no volume necessário para construir um Estado de bem-estar social em bases sólidas e eficaz. Mas essa construção é para décadas e não pode ser comprometida, como o foi, por uma profusão eleitoreira de programas ditos sociais, mas carentes de avaliação na sua dimensão e na sua eficácia operacional e distributiva. E tampouco prejudicada por uma gastança incompatível com um orçamento público que mantenha uma dívida pública de tamanho suportável em seus efeitos, o qual deve também incluir recursos para investimentos indispensáveis ao crescimento econômico.

Esse Estado de bem-estar social não é obra para pais da pátria e seu paternalismo assistencial eleitoreiro. Se o crescimento econômico for frágil e não assegurar aos mais pobres o seu próprio empoderamento econômico, não haverá uma inclusão social digna do nome.

Este artigo integra série sobre uma estratégia para o País diante da crise atual. O primeiro é de 19/11/2015 e os demais são encontrados em opiniao.estadao.com.br/artigo-de-opiniao/, na primeira e terceira quintas-feiras de cada mês, com títulos iniciados pela palavra estratégia.*ROBERTO MACEDO É ECONOMISTA (UFMG, USP E HARVARD), CONSULTOR ECONÔMICO E DE ENSINO SUPERIOR