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Facebook na berlinda

Aos senadores, Zuckerberg disse estar 'arrependido' por ter confiado, à época, que a Cambridge Analytica apagaria os dados dos usuários da rede social

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Por Redação
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Os senadores dos Estados Unidos não gostaram do primeiro depoimento de Mark Zuckerberg, fundador e CEO do Facebook, prestado aos Comitês Judiciário e de Comércio do Senado. Também não devem ter gostado do que ouviram ou leram milhões de assinantes daquele serviço. Durante a sessão, na terça-feira passada, Zuckerberg não deixou claro para os congressistas que medidas pretende adotar para garantir a segurança das informações dos mais de 2 bilhões de usuários que se conectam à rede social criada por ele.

O Facebook está no centro das atenções do Congresso dos EUA desde que vieram a público as denúncias de uso não autorizado dos dados de, aproximadamente, 87 milhões de usuários pela Cambridge Analytica, consultoria de marketing político que prestou serviços para a campanha eleitoral do presidente Donald Trump.

A consultoria está sendo acusada de favorecer ilegalmente a eleição de Trump. Tendo como base os dados dos usuários do Facebook aos quais teve acesso em 2015, a empresa teria direcionado a campanha eleitoral de Trump de modo a fazer chegar aos eleitores mensagens mais assertivas, de acordo com perfis sociais, econômicos, ideológicos e comportamentais dos americanos.

Aos senadores, Zuckerberg disse estar “arrependido” por ter confiado, à época, que a Cambridge Analytica apagaria os dados dos usuários da rede social. A empresa não o fez e ainda os utilizou ilegalmente, como consta da acusação que levou ao afastamento do CEO da empresa, Alexander Nix, no dia 20 de março.

Os chamados termos de uso do Facebook, contrato-padrão com o qual o usuário da rede social deve concordar antes de criar um perfil, suscitaram alguns dos momentos mais tensos do depoimento de Mark Zuckerberg. Nas palavras do próprio empresário, tais termos “são longos e confusos para o americano médio”, ao que o senador republicano John Kennedy, da Louisiana, retrucou duramente, dizendo que, se assim são, os termos de uso da rede são “uma porcaria” e deveriam ser redigidos em “linguagem compreensível” para aquele cidadão.

Nos termos de uso estão as regras sobre a privacidade dos dados dos usuários e as possibilidades de uso destes dados estratégicos pelo Facebook e por empresas parceiras. O modelo de negócios da empresa assenta-se justamente nesse valiosíssimo e cobiçado ativo.

Não foi por outra razão que Mark Zuckerberg passou boa parte do tempo de seu depoimento pedindo desculpas aos senadores e prometendo usar seus melhores recursos, tanto materiais como humanos, para desenvolver soluções a fim de tornar mais robusta a segurança dos dados armazenados nos servidores de sua empresa. Que soluções seriam estas, ele não foi capaz de detalhar.

Diante da vagueza nas respostas de Zuckerberg, alguns senadores passaram a criticar o modelo de negócios do Facebook, que, no entendimento deles, fatura sobre dados que não consegue manter em segurança. Maggie Hassan, democrata por New Hampshire, propôs uma nova regulamentação do Facebook, tal como já ocorre com as empresas de mídia.

Além da questão da segurança dos dados que são compartilhados na internet, o escândalo que trouxe à luz as relações estranhas entre o Facebook e a Cambridge Analytica serve como alerta à suposta saúde democrática dos debates políticos na esfera pública digital.

Se é verdade que as redes sociais ampliaram o fórum de debate sobre variadas questões neste século 21, desde as mais banais até as que têm o condão de orientar o destino de um país, também é correto afirmar que a amplitude de vozes, nem sempre relevantes, e a falta de mediação qualificada neste debate deram azo a um sem-número de distorções que não servem para nada além de poluir o ambiente digital.

Os problemas políticos e econômicos do Facebook hão de ser tratados por seus executivos e as autoridades dos EUA. Já a mediocridade do debate na esfera pública digital é um problema de cada um dos que dela fazem uso.