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FHC e a tormenta petista

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Por Redação
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Há raros momentos, nos períodos de tormenta que ciclicamente afetam a vida de um país, em que um gesto de serenidade e de lucidez ilumina o cenário para expor, aos que têm olhos para ver, o melhor caminho para a bonança. Em artigo publicado domingo no Estado, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso rejeitou qualquer conversa com o PT que “cheire a conchavo ou, pior, que permita a suspeita de que se deseja evitar a continuidade nas investigações em marcha” sobre corrupção no governo. E acrescentou: “Para dialogar, não adianta se vestir em pele de cordeiro. Fica a impressão de que o lobo quer apenas salvar a própria pele”. “Será que chegou o tempo”, diz o texto, “de rezar pela sorte de alguns setores da vida empresarial e política? Talvez. Mas a hora para agir já não é mais, de imediato, do Congresso e dos partidos, mas, sim, da Justiça.” É o caminho.

Com esse artigo, o líder tucano desmonta a ardilosa tentativa lulopetista de envolver o maior partido da oposição num “diálogo” capaz de neutralizar politicamente tanto a possibilidade de eventualmente o Congresso votar o impeachment de Dilma Rousseff – por conta, por exemplo, da rejeição das contas do governo pelo TCU – como de a Operação Lava Jato resultar na condenação dos líderes do PT e da base aliada por envolvimento com o escândalo da Petrobrás e outros, como do setor elétrico, a que as investigações levem.

O lulopetismo é conhecido pela soberba com que despreza opiniões que não sejam as suas próprias e pela falta de cerimônia com que procura o apoio dos adversários – que normalmente trata como inimigos – nos momentos de apuro. Foi assim que, por ocasião do estouro do escândalo do mensalão, no primeiro mandato de Lula, sob o argumento da necessidade de preservar o equilíbrio institucional, a oposição foi persuadida a aliviar a pressão sobre o Planalto. A partir daí, contando com a sólida base de apoio popular de que então dispunha, Lula logrou dar a volta por cima e reeleger-se em 2006.

Em seu artigo, Fernando Henrique recorda que tomou a iniciativa, em 2013, quando Dilma e os ex-presidentes da República brasileiros viajaram à África do Sul para o funeral de Nelson Mandela, de sugerir, diante “do tamanho da crise em gestação”, que todos se unissem para “propor ao País um conjunto de reformas para fortalecer as instituições políticas”. Mas a sugestão não prosperou. Mais do que isso: “Naquela ocasião, como em outras, a resposta do dirigente máximo do PT foi ora de descaso, ora de reiteração do confronto, pela repetição do refrão autorreferente de que antes dele tudo era pior”.

O líder tucano afirma que a recusa de entrar num mero “conchavo” com os petistas “não implica dizer um não intransigente ao diálogo”. Mas é essencial que os donos do poder adotem uma postura realmente democrática: “Tomara que as aflições pelas quais passam o PT e seus aliados lhes sirvam de lição e os afastem da arrogância e do contínuo desprezo pelos adversários, até agora tratados como inimigos. É hora de reconhecerem de público que a política democrática é incompatível com a divisão do País entre ‘nós’ e ‘eles’”.

Com a hipocrisia de travestir de intenções altruísticas uma descarada tentativa de pedir socorro num momento de desespero, Lula botou seus porta-vozes em campo para sondar a possibilidade de colocar a autoridade moral e o prestígio político de Fernando Henrique Cardoso – que sempre contestou e tentou destruir – a serviço da sobrevivência de seu periclitante projeto de poder. O PT é um partido que “chegou nitidamente ao fim de um ciclo” porque “não se autorreformou, não capitaneou uma grande mudança pela reforma política”. E este diagnóstico não é de FHC, mas de um fundador e importante líder do partido, o ex-governador gaúcho Tarso Genro, em entrevista ao Estado publicada no domingo.

Do líder tucano é a recomendação de que “cabe aos donos do poder o mea culpa de haver suposto sempre serem a única voz legítima a defender o interesse do povo”. A crise em que o lulopetismo mergulhou o País parece estar ensinando ao povo brasileiro que é preciso escolher melhor quem tem a missão de defender seus interesses.