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Informação nas eleições

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Por Redação
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Até o fim das eleições presidenciais, os pesquisadores do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) não podem publicar os seus estudos. Antes das eleições, somente as publicações com data de lançamento regular, como os boletins, por exemplo, podem vir a público. Essa restrição se baseia numa inédita decisão do Ipea, adotada no início de agosto.A novidade gerou contestação interna e, por causa da posição restritiva do Ipea, o diretor de estudos e políticas sociais do instituto, Herton Araújo, pôs o seu cargo à disposição.Numa reunião da diretoria colegiada do Ipea, realizada no dia 9 deste mês, Araújo tentou reverter a decisão. Ele desejava publicar um estudo técnico com dados sobre miséria social no Brasil a partir da última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), divulgada no mês passado. No entanto, ele foi voto vencido e a decisão restritiva foi mantida: os estudos somente devem ser divulgados após a realização do segundo turno eleitoral.Em nota, o Ipea, vinculado à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, afirmou que a decisão se baseia "no entendimento de que uma instituição de pesquisa de Estado não deveria, neste período, suscitar acusações de favorecimento a um ou outro candidato". Segundo o órgão, a restrição seria uma decorrência da lei eleitoral.Não há dúvida de que toda informação, dentro de um período de campanha eleitoral, pode vir a ter influência política e suscitar acusações de "favorecimento a um ou outro candidato". Mas, numa democracia, esse risco não é motivo suficiente para impedir a transmissão de informações. Veja-se, por exemplo, o caso das pesquisas de intenção de voto. Mesmo que possam influir - como, de fato, influem - sobre a decisão do eleitor, elas podem ser publicadas. E o eleitor quer contar com essa informação na hora de decidir o seu voto.A qualidade de uma democracia não vem por uma isenção "negativa": nenhuma informação, nenhuma influência. A qualidade de uma democracia vem - entre outras coisas - pela qualidade da informação. E é por essa razão que, num Estado democrático, não se pode controlar a informação. Garante-se a liberdade de expressão para assegurar que o cidadão tenha acesso à informação e possa decidir o seu voto com base naquelas informações que julgar consistentes. A ideia é simples: eleitor mais informado, voto mais consciente.No caso do Ipea, a sua missão está estreitamente ligada à produção e à transmissão de informações. Segundo o site do instituto, a sua missão é "aprimorar as políticas públicas essenciais ao desenvolvimento brasileiro, por meio da produção e disseminação de conhecimentos e da assessoria ao Estado nas suas decisões estratégicas". E ainda especifica que faz parte da sua contribuição à sociedade gerar "conhecimento mais consistente e disseminado em relação ao desempenho do Estado e da dinâmica da sociedade" e um "debate público mais qualificado". Ou seja, o Ipea tem um importante papel na produção de informações ao cidadão sobre o desempenho do Estado. E, se existe um momento em que o cidadão mais precisa ter acesso a essas informações, é agora, quando ele está decidindo o seu voto.Se o Ipea é - como deve ser - uma instituição de Estado, e não uma instituição "do governo", a publicação das informações e estudos de que disponha enriquece o debate eleitoral, e não o contrário. Outra coisa seria que algum estudo do Ipea tivesse um viés ideológico determinado e que a sua publicação, em nome do Ipea, transmitisse uma informação equivocada - ou, ao menos, duvidosa - ao público. Mas, para a eventualidade de um caso como esses, a restrição atualmente vigente no Ipea - não publicar estudos "não periódicos" até o término das eleições - não seria suficiente, já que não cabe a um instituto "de Estado" publicar - seja quando for, antes ou depois das eleições - material desse estilo. Isso seria utilizar dinheiro público para fins ideológicos. Isso seria utilizar o nome de uma instituição de Estado para fins ideológicos. E isso é aparelhamento, antes ou depois das eleições.