Imagem ex-librisOpinião do Estadão

Mais confiança, com cautela

Os planos de ajuste das contas públicas e de recuperação dos negócios serão executados tanto mais facilmente quanto mais prontamente reagirem o consumo e a atividade industrial

Exclusivo para assinantes
Por Redação
2 min de leitura

Consumidores e empresários continuam mostrando otimismo, ou menor pessimismo, em relação aos próximos meses, segundo pesquisas de entidades de representação do comércio e da indústria. Essa disposição, bem melhor que a apontada pelas sondagens na pior fase da retração econômica, é um dos ativos mais importantes do governo do presidente Michel Temer. Os planos de ajuste das contas públicas e de recuperação dos negócios serão executados tanto mais facilmente quanto mais prontamente reagirem o consumo e a atividade industrial. Que a recuperação tenha começado parece indiscutível, mas os sinais continuam mistos. Alguns apontam maior atividade, enquanto outros indicam desempenho ainda fraco em certos setores e hesitação nas decisões. De toda forma, a maior parte do cenário – há exceções – fica menos sombria, mês a mês, nas comparações com o quadro de um ano antes. Isso é visível, por exemplo, na sondagem divulgada nessa terça-feira pela Confederação Nacional da Indústria (CNI).

A melhora do cenário reflete-se no humor das pessoas consultadas nas pesquisas. Impedir a recaída no desânimo deve ser uma das preocupações principais do governo. Para isso é preciso mostrar avanços nos principais programas – de conserto das contas públicas, de reformas e também de reativação. Sem dinheiro para gastar, o governo pode criar atividade e empregos por meio de estímulos à construção de moradias e da retomada de investimentos em infraestrutura. Os leilões de quatro aeroportos foram só um impulso inicial e ainda limitado para essa retomada.

A última sondagem da CNI mostra avaliações ainda negativas da produção industrial e do emprego no setor, em fevereiro, mas menos pessimistas que as de um ano antes. Dados mais seguros ainda serão divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Uma estimativa do Ipea, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, também publicada ontem, indicou para o mês passado uma produção 0,3% maior que a de janeiro. Mas o quadro exibe desempenhos divergentes. Um exemplo é o contraste entre a fabricação de veículos, com aumento mensal de 5,9%, e a produção de aço, com recuo de 3,5%.

Na sondagem da CNI, o nível de estoques industriais permanece ajustado – um dado positivo porque aponta a possibilidade de maior produção a curto prazo. O mesmo levantamento, no entanto, confirmou três fatos menos promissores. A disposição de contratar, embora mais alta que a de um ano antes, permanece em território negativo, com 45,9 pontos (o nível de indiferença é de 50 pontos). O segundo fato pouco animador é o índice de 63% de uso da capacidade instalada. Ainda há espaço para um bom aumento da produção antes de serem necessários novos investimentos em máquinas, equipamentos e instalações. Um terceiro detalhe confirma esse ponto. A intenção de investir baixou 0,3 ponto, para 46,6 pontos em março, interrompendo 10 meses de melhora. Mas o índice foi 7,2 pontos mais alto que o verificado um ano antes.

Apesar da atividade ainda fraca, os empresários mostraram otimismo quanto à demanda interna, às exportações e às compras de matérias-primas. O indicador relativo ao emprego continuou em alta, mas permaneceu na área negativa, em 48 pontos. Nesse caso, pode-se falar de menor pessimismo.

Movimento semelhante, de melhora, mas ainda no território negativo, foi registrado em pesquisa da Confederação Nacional do Comércio (CNC). A intenção de consumo das famílias aumentou 1,4% em março e atingiu 68,2 pontos. Mas a linha de indiferença, nesse caso, fica em 100 pontos. A disposição melhorou em relação ao mês anterior e a março de 2016, mas continuou mostrando um quadro de insegurança.

Os entrevistados indicaram um nível de consumo atual inferior ao de um ano antes. Se a resposta for verdadeira, deve ser explicável pelo aumento do desemprego e pela erosão da renda. A baixa da inflação deve ter sido insuficiente para compensar essa perda e para estimular a volta às compras. É um obstáculo a mais para o governo considerar.