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Mais pacientes, menos leitos

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Por Redação
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A comparação entre a variação do número de contratos de planos de saúde e a quantidade de leitos hospitalares disponíveis no País nos últimos três anos aponta para um problema social grave. Reportagem do Jornal da Tarde (JT) -10/1- mostrou que há cada vez mais usuários, mas cada vez menos vagas nos hospitais. De setembro de 2008 a setembro de 2011, o número de contratos de plano de saúde aumentou 13,5% - de 41,4 milhões para 47 milhões -, mas o número de leitos nas redes pública e privada diminuiu 10,5%, de 511,6 mil para 458,1 mil. A conta não fecha. Se já não era fácil encontrar leitos disponíveis nos hospitais conveniados aos planos de saúde ou por eles operados diretamente, daqui para a frente ficará ainda mais difícil.A questão, obviamente, não se resume a simples comparações numéricas. Novas tecnologias, novos procedimentos e novos padrões de gestão dos serviços médicos e hospitalares vêm reduzindo o período médio de internação para os mais variados casos. Isso permite que, em tese, seja possível atender mais pacientes com igual número de leitos, ou até com pequena redução, sem perda de qualidade do atendimento. Mas o fosso entre o número de pessoas com planos de saúde e o de leitos hospitalares se ampliou de tal modo que os avanços da medicina e da gestão hospitalar não conseguirão superar o hiato.São várias as causas dessa situação. As operadoras assumiram um compromisso que talvez não possam honrar, pois, como observou o presidente do Sindicato dos Hospitais de São Paulo (Sindhosp), Dante Montagnana, "venderam mais planos em comparação com o número de leitos". Na sua opinião, esse é um problema a ser resolvido pelos próprios planos de saúde, não pelos hospitais. E ele surgiu, diz Montagnana, porque a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) não regulamentou a questão.O presidente do Sindhosp lembra também que, no caso de São Paulo, a liquidação de operadoras de planos de saúde que tinham hospitais próprios agravou o problema, pois esses hospitais ficaram ociosos.É preciso acrescentar que, além da falta de iniciativa da ANS, o setor público tem outras responsabilidades. A precariedade dos serviços do Sistema Único de Saúde (SUS) - cujo objetivo é universalizar os serviços de saúde, mas faz isso sem a devida preocupação com a qualidade do atendimento - está forçando parte da população a pagar para dispor desses serviços."Enquanto os ideólogos do SUS, com certo cinismo, louvam a universalização da saúde estatal, na vida real tudo o que o pequeno cidadão quer é fugir do ambiente pavoroso dos hospitais públicos", como observou o consultor da área de defesa do consumidor do JT, Josué Rios.A melhora da renda das classes C e D tem permitido que maior número de famílias adira aos planos de saúde, como mostram as estatísticas mais recentes. Há, assim, um alívio nas pressões sobre o governo na área de atendimento de saúde.Mas as pressões persistem, e até aumentam, para os que, por suas condições financeiras, continuam a depender exclusivamente do SUS. Em muitas localidades, em lugar da expansão e da melhoria do atendimento pelo SUS, o que ocorre é a redução dos serviços, porque, como têm observado representantes dos hospitais e das associações médicas, é irrisória a remuneração paga pelo sistema único aos que atendem os pacientes por ele encaminhados. "A desativação progressiva dos leitos ocorreu, principalmente, no setor privado conveniado ao SUS", observou o Conselho Federal de Medicina em sua página eletrônica recentemente, ao analisar o protesto dos médicos que atendem pacientes do SUS.Enquanto não se cobrar das autoridades a efetiva prestação de serviços de qualidade e a remuneração adequada aos particulares que atendem pacientes do SUS, a população continuará, como destacou Rios, enganada duas vezes. Pelos governantes, que nunca pensaram em integrar de maneira eficiente os serviços público e privado na área de saúde, e por operadoras de planos de saúde, que "cada vez mais deixam de entregar corretamente aquilo que vendem aos consumidores".