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Maquiagem de austeridade

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Por Redação
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Depois de quatro anos de muito desperdício e de muita lambança nas finanças públicas, a presidente Dilma Rousseff resolveu criar uma imagem de austeridade. Pediu um estudo sobre a redução do número de Ministérios e reorganização do governo. Que a solicitação tenha sido feita, como informaram os jornais, parece indiscutível. Que ela esteja disposta a racionalizar a administração, começando pelo fechamento de algumas pastas, é outra história. Isso vai contra sua biografia, tanto no papel de presidente como na função de ministra de seu antecessor. Mas, a julgar verdadeira também essa parte das informações, ainda restarão poucos motivos para otimismo. A mera extinção de alguns gabinetes – ou eliminação de alguns títulos de ministro – terá impacto muito limitado nas contas federais, embora essa providência seja cobrada por alguns políticos como prova de real compromisso com o ajuste.

O governo poderá, sem prejuízo para a administração pública, fechar os Ministérios da Pesca, dos Portos, de Assuntos Estratégicos e da Micro e da Pequena Empresa – para citar só quatro exemplos óbvios.

O Ministério da Agricultura poderá cuidar da pesca; o dos Transportes, dos portos; o do Planejamento, dos assuntos estratégicos; e o do Desenvolvimento, das pequenas e microempresas. Assim era em outros tempos. Alguma economia poderá resultar, se funções forem eliminadas, mas o ganho será muito limitado.

Ainda haverá um secretário para cuidar da pesca e ele precisará de funcionários e de meios materiais. Isso valerá também para as demais funções absorvidas por antigos Ministérios. Além do mais, falta saber se o quadro de pessoal será reduzido. Essa consequência é muito improvável, especialmente porque funcionários de carreira formam boa parte dos quadros.

O benefício real poderá vir de outra forma. A multiplicação de Ministérios ocorreu por motivos políticos. Não resultou de necessidades administrativas nem de um esforço de valorização de certas funções consideradas estratégicas. Postos de primeiro escalão – acompanhados, naturalmente, de vagas de auxiliares de vários níveis e de assessores – foram criados para acomodar companheiros de partido e aliados ou pessoas por eles indicadas. Títulos de ministro foram conferidos a cidadãos absolutamente despreparados para a função, tanto por desconhecimento do assunto quanto pela inexperiência administrativa.

O desprezo à competência específica e à capacidade gerencial já se manifestava, especialmente no período petista, na distribuição de postos importantes. O presidente Lula nunca levou a sério questões como eficiência e produtividade na administração pública. Quanto a sua sucessora, chegou à Presidência carregando uma estranha e injustificável fama de gerentona, desmentida nas funções ministeriais e ainda mais claramente na de chefe do governo.

A redução de Ministérios pode limitar o campo da distribuição de favores, dificultar o compadrio político e reduzir as ocasiões de desperdício e de corrupção. Já será um ganho, mas nada espetacular. Ganhos importantes, para a eficiência gerencial e para a economia de dinheiro, só virão com mudanças muito mais amplas, como a severa redução dos postos comissionados, a maior flexibilidade na política de pessoal e a profissionalização efetiva da administração.

Políticas de profissionalização foram raras, desde a criação do Departamento Administrativo do Serviço Público (Dasp), em 1938, e as ilhas de competência no setor público resultaram desses esforços. Nada sério se tentou, nessa área, nas gestões de Lula e de Dilma.

Além do mais, a boa administração das contas públicas será sempre limitada pela rigidez do Orçamento, consequência do populismo e dos compromissos políticos irresponsáveis. Austeridade para valer é algo distante. A nova iniciativa da presidente poderá servir principalmente para maquiar sua imagem de administradora, depois de anos de maquiagem, sempre muito precária, dos balanços federais.