Imagem ex-librisOpinião do Estadão

Máquinas eleitorais

Exclusivo para assinantes
Por Redação
2 min de leitura

Eleitoralmente, sem dúvida foi frutífero para a presidente Dilma Rousseff o programa do governo federal de doação de máquinas para municípios com menos de 50 mil habitantes poderem recuperar estradas vicinais. A grande capilaridade desse programa, que abrangia a maioria dos municípios brasileiros, pode ter assegurado boa parte dos votos de que a candidata Dilma Rousseff necessitou, no ano passado, para sua reeleição. Se foi bom para a candidata e para parte dos moradores dos municípios que receberam as máquinas, melhor para eles. Mas a festa acabou. Quem ganhou ganhou; quem não ganhou não ganha mais. O programa, tão alardeado por Dilma e por seus aliados nos Estados como símbolo da atitude republicana do governo federal, foi discretamente extinto na prática. Se tinha mesmo esse caráter republicano, era um republicanismo de ocasião.

Entre janeiro e abril de 2014 – período em que a presidente mais entregou equipamentos às prefeituras, embora ainda fosse não oficialmente candidata do PT à reeleição por causa do calendário eleitoral –, as 18 empresas selecionadas para fornecer retroescavadeiras, motoniveladoras, caminhões, caçambas e caminhões-pipa para serem distribuídos aos municípios receberam R$ 2,5 bilhões, de acordo com levantamento do Estadão Dados feito nas contas do governo. Nos quatro primeiros meses deste ano, o valor se reduziu para R$ 75 milhões. Se for considerado o dinheiro utilizado nesse programa pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), responsável pela execução da maior parte dele, chamado PAC 2 Equipamentos, a constatação é a de que ele simplesmente foi extinto: nem um tostão foi gasto no programa neste ano.

As despesas do governo federal com o PAC 2 Equipamentos cresceram de maneira vertiginosa, tendo alcançado R$ 5,5 bilhões no ano passado, somando-se os gastos de responsabilidade do MDA e dos demais Ministérios, como mostrou reportagem do Estado. Aquele foi, convém lembrar, o ano em que as contas do governo federal apresentaram o pior resultado em muito tempo – e a contribuição do PAC 2 Equipamentos para o desastre fiscal não foi pequena.

Para recompor as finanças públicas e assegurar o crescimento futuro, o governo está sendo obrigado a fazer um severo ajuste fiscal, que causa desemprego e queda de renda.

Só no ano passado, reconhece o MDA, foram compradas mais de 19 mil máquinas, distribuídas a praticamente todos os municípios brasileiros abrangidos pelo PAC 2 Equipamentos. A entrega de parte dessas máquinas incluiu palanques para antecipação da campanha eleitoral de Dilma. “Somos um governo que preza muito o critério republicano”, disse Dilma num desses palanques, montado em fevereiro de 2014 na cidade de Betim, em Minas Gerais, Estado pelo qual tinha especial interesse, pois fora governado por seu rival tucano Aécio Neves. “Não olhamos para a opção partidária do prefeito, para a opção futebolística e muito menos para a religiosa. Todos os prefeitos (de municípios com até 50 mil habitantes) têm direito ao kit das três máquinas.”

Não foi só para a opção política dos prefeitos que o governo deixou de olhar – se é que agiu mesmo desse modo. Não olhou também para o uso dado pelas prefeituras aos equipamentos doados. Em exame de uma amostra aleatória dos municípios beneficiados pelo PAC 2 Equipamentos no início do ano passado, a Controladoria-Geral da União (CGU) constatou, entre outras irregularidades, a falta de controle do governo federal e das prefeituras sobre o programa. Sem revisão e sem guarda adequada, as máquinas já apresentavam sinais de má conservação. Além disso, elas eram operadas por trabalhadores não adequadamente treinados. Não havia, na grande maioria dos casos, registro da utilização dos equipamentos, sobretudo no atendimento de seus públicos-alvo, os agricultores familiares e os assentados da reforma agrária.

Um dos objetivos do PAC 2 Equipamentos era estimular a produção industrial. Sem encomendas, agora as empresas produtoras de caminhões e outros equipamentos demitem, o que ajuda a engordar as estatísticas que mostram o aprofundamento da crise.