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Mercados ainda doentes

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Por Redação
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A crise financeira já custou montanhas de dinheiro, destruiu milhões de empregos e ainda vai assombrar o mundo por muito tempo. O novo socorro aos bancos da Irlanda e o rebaixamento da classificação da Espanha pela Moody"s, na quinta-feira, servem como avisos para trazer os mais otimistas de volta à realidade. A insegurança ainda assombra os mercados, três anos depois dos primeiros sinais do grande estouro da bolha de crédito. Vários bancos voltaram a dar lucro, no mundo rico, depois de receber injeções fortificantes de muitos bilhões de dólares. Mas a recuperação é desigual, grandes instituições continuam dependentes de governos e as finanças públicas permanecem devastadas na maior parte dos países desenvolvidos. Todas essas questões estarão na agenda do Grupo dos 20 (G-20) e do Fundo Monetário Internacional (FMI) nos próximos dias.O governo irlandês já aplicou 32,6 bilhões em bancos e instituições de crédito imobiliário para evitar uma quebradeira. Nesta semana o ministro das Finanças, Brian Lenihan, anunciou a injeção de mais dinheiro em bancos ainda em dificuldades. Com mais esse aporte, o socorro total chegará a cerca de 50 bilhões, equivalentes a US$ 68 bilhões.Esse é quase o valor da capitalização da Petrobrás, alardeada pelo governo brasileiro como a maior operação desse tipo realizada até hoje em qualquer parte do mundo. Mas há uma visível desproporção entre os dois casos. A Petrobrás é a maior empresa de um país com Produto Interno Bruto (PIB) superior a US$ 1,5 trilhão. A ajuda aos bancos da Irlanda equivale a um terço do PIB do país. Esse detalhe dá uma ideia mais clara do problema causado à economia irlandesa pela bolha financeira. Os danos ocasionados pelo estouro podem ter variado de um para outro país, mas em nenhum os estragos foram desprezíveis. Nos Estados Unidos, algumas grandes instituições já conseguiram operar sem o apoio do governo. A próxima grande empresa financeira a tentar esse caminho será a seguradora AIG, socorrida no pior momento da crise com US$ 182,3 bilhões do Tesouro e US$ 20 bilhões do Federal Reserve.Pelo novo acordo, o governo converterá suas ações preferenciais em ordinárias, para vendê-las no mercado. A troca das ações foi marcada para o primeiro trimestre do próximo ano. Além disso, a AIG emitirá novas ações ordinárias e tentará levantar US$ 3 bilhões em créditos bancários. Mas essa arrumação não basta. É preciso, sem dúvida, reconduzir à normalidade as instituições passíveis de recuperação e varrer os cacos das outras. Esse é, no entanto, apenas o trabalho imediato. É hora de montar sistemas de segurança para evitar crises semelhantes ou, no mínimo, para torná-las menos prováveis. O Congresso americano já aprovou novas normas de segurança. Mas a política de prevenção só funcionará plenamente se houver um grau razoável de coordenação internacional. Isso dependerá da adoção de normas preparadas por entidades multilaterais, como o Banco de Compensações Internacionais (BIS) e o FMI. Essa coordenação envolverá dificuldades políticas, embora todos os governantes do G-20 sejam formalmente favoráveis a uma reforma de alcance global.Novas normas para os bancos foram discutidas e aprovadas no âmbito do BIS por autoridades monetárias das principais economias. A implantação será lenta e deverá completar-se em 2019. Essa lentidão já resultou de um complicado jogo de pressões. Mesmo o cumprimento do cronograma acertado é duvidoso. Normas anteriormente fixadas pelo BIS, com base em acordos formais, nunca foram integralmente implementadas por vários países. A crise financeira iniciada em 2007 foi em boa parte facilitada por essa falha. No Brasil, onde a regulamentação chegou a ser mais severa que a recomendada pelo BIS, o sistema financeiro passou sem maiores danos pela crise global. A arrumação do sistema financeiro é apenas um dos ajustes indispensáveis. O outro é a correção dos enormes desequilíbrios fiscais acumulados pelas economias do mundo rico. Tudo isso tornará longa e penosa a convalescença da economia mundial.