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No rumo da tempestade

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Por Redação
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Se os maus presságios se confirmarem, o Brasil terá de enfrentar em 2015 uma tempestade quase perfeita - aumento de juros nos Estados Unidos, financiamento mais caro, preços em queda no mercado de matérias-primas, crise na Rússia, crescimento menor na China e recuperação muito lenta na Europa. Nem tudo será ruim: a economia americana continuará avançando e o ritmo da expansão chinesa, embora mais fraco, ainda será próximo de 7% e isso também contribuirá para algum dinamismo no comércio global. Mas o País estará pouco preparado para aproveitar as oportunidades. Depois de anos de mau governo e de baixo investimento, os fundamentos da economia nacional são frágeis e a indústria compete com muita dificuldade no mercado global.Para o Brasil, as projeções mais otimistas apontam um crescimento econômico próximo de 1,5% no próximo ano. A Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) incorpora como referência a estimativa de 0,8%. No mercado financeiro a mediana das previsões está próxima de 0,7%. O futuro ministro da Fazenda, Joaquim Levy, promete um ajuste balanceado das contas públicas, mas, de toda forma, ele deverá trabalhar por um superávit primário - dinheiro para o pagamento de juros - equivalente a 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB). Para ser fiel a esse compromisso ele deverá dosar o aperto de acordo com as condições internas e externas - e estas poderão ser muito desfavoráveis. Além disso, o Banco Central (BC) terá de cuidar de pressões inflacionárias ainda muito fortes e de responder, ao mesmo tempo, aos problemas causados por um cenário internacional potencialmente turbulento. O presidente do BC, Alexandre Tombini, já indicou a disposição de intervir no mercado cambial de acordo com o tamanho dos desafios. Câmbio, custo de financiamentos no mercado internacional e pressões inflacionárias dependerão em boa parte de como o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) ajustar sua política de juros. A próxima elevação da taxa ocorrerá quase certamente em 2015, talvez no meio do ano, segundo as indicações do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc), formado por dirigentes do Fed. Depois de sua última reunião, na quarta-feira, o comitê divulgou as novas projeções formuladas por seus integrantes: crescimento econômico entre 2,6% e 3% em 2015, desemprego na faixa de 5% a 5,2% e preços ao consumidor com aumento entre 1% e 1,6%. A inflação ainda bem abaixo da meta de longo prazo (2% ao ano) poderá retardar o aumento de juros, há vários anos mantidos entre zero e 0,25% ao ano. Mas todos os membros do comitê projetam juros mais altos em 2015. A mediana das estimativas indica taxas de 1,125% para o fim de 2015 e de 2,5% para 2016. O quadro ficará pior se a crise russa se prolongar e a aversão ao risco desviar capitais dos emergentes. Se a política do Fed resultar em valorização do dólar, no Brasil os dirigentes do BC terão de enfrentar um dilema. Um real depreciado facilitará as exportações e a melhora do saldo comercial, mas também poderá alimentar a inflação. Neste ano, preferiu-se limitar a desvalorização da moeda nacional e conter o risco inflacionário. Enquanto isso, a depreciação das matérias-primas deverá prejudicar a receita brasileira de exportações. O risco é especialmente importante porque o Brasil, nos últimos dez anos, passou a depender excessivamente das vendas de produtos básicos e perdeu espaço no comércio de bens manufaturados. A relação semicolonial com a China, grande compradora de commodities, é parte dessa história. Mas a perda de espaço no mercado internacional de bens industrializados é principalmente uma consequência de erros da política econômica e da diplomacia comercial petista. Em vez de cuidar da eficiência do sistema produtivo e da modernização da indústria, o governo tentou ressuscitar a velha política de substituição de importações, com protecionismo e estímulos seletivos. A esse erro foi acrescentada uma estratégia de relações preferenciais com países em desenvolvimento. Com uma política mais racional, o País estaria muito mais preparado para qualquer turbulência.