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Opinião|O agronegócio e sua dinâmica

Atualização:

Há coisas que não esperam. Na família ou entre amigos, o momento do apoio, do abraço. Nos negócios ou na administração de um país, não é possível esperar o balanço de receita e despesas chegar a R$ 170 bilhões de déficit fiscal. Esse é o montante da dívida que temos de enfrentar no Brasil, fruto da monstruosa irresponsabilidade e da falta de urgência do governo que sai. O atual governo volta às raízes, pois dá prioridade ao ajuste fiscal. Esse novo olhar do governo Michel Temer, do lado da receita, passa necessariamente pela dinâmica extraordinária do agronegócio. Esse é o negócio brasileiro que segura a balança comercial, que irriga todo este país de dimensões continentais com esperança, matéria-prima que se iguala ao abraço aos amigos, à família.

No dia 15 de maio, um artigo assinado por um seleto grupo de economistas e experientes analistas e publicado neste jornal (A economia agropecuária brasileira. O que fazer?) apontou importantes medidas necessárias para sustentar e dinamizar a agropecuária brasileira. A matéria é oportuna diante da conjuntura da crise econômica e política do País. O texto enfatiza exatamente a importância da dinamização do agronegócio brasileiro em face de sua capilaridade sobre toda a economia nacional.

O governo que sai trouxe desconfiança ao meio produtivo, insegurança aos investidores e aumento no custo Brasil. Houve sequelas graves em algumas cadeias produtivas e uma diminuição da atividade comercial brasileira. Mas, apesar de tudo, a balança comercial seguiu com vida, mesmo sem o menor esforço em acordos comerciais e menos ainda em definir regras para reduzir as distorções nas transações comerciais internacionais.

A infraestrutura e a logística do País seguem como barreiras-chave para o pleno desenvolvimento das atividades do agronegócio. A ineficiência da logística brasileira faz com que o setor seja menos competitivo em relação aos seus concorrentes estrangeiros. Agora, a notória escassez de recursos financeiros colabora para o estabelecimento de uma agenda de prioridades. Temos ajustes a serem feitos no programa de ampliação e construção de armazéns, uma solução definitiva para a expansão da malha viária que ligue o Centro-Oeste aos portos das Regiões Norte e Nordeste e medidas para melhorar a eficiência dos portos. Sem investimentos direcionados a esses pontos, o setor terá de conviver com os elevadíssimos custos para exportar, reduzindo a capacidade de ampliação de resultados.

A adoção de tecnologias avançadas em todos os subsetores do agronegócio, desde a fabricação de insumos até o processamento de produtos, é essencial. Para isso, o estreito relacionamento das ações público-privadas ganha ainda mais importância. Sendo assim, pesquisa e inovação são pressupostos essenciais para a continuidade do processo de aprimoramento do setor, além da aprovação de procedimentos relativos à defesa agropecuária.

Uma entidade fundamental para o agronegócio e que presta relevantes serviços ao setor é a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Especificamente em relação a ela, os pressupostos do citado artigo são de que é necessário instituir normativamente um processo de ocupação de cargos dirigentes fundamentados exclusivamente no mérito e na capacidade técnica dos seus ocupantes.

Outro desafio colocado no caminho do agronegócio diz respeito à legislação trabalhista vigente (implantada na década de 1950) nas atividades rurais, que são, por natureza, absolutamente diferentes das exercidas nas áreas urbanas. A atividade no campo não obedece aos pressupostos adotados nos setores industrial, comercial e de serviço.

Mesmo sem um cenário econômico e político estável, o agronegócio brasileiro se mostra o setor menos abalado com a crise, que ainda deve durar mais um tempo no Brasil.

Além do potencial de alcance de mercados internacionais, a adequação ambiental da produção, pautada na eficiência do uso de recursos naturais e financeiros, é uma grande oportunidade que deve ser observada com mais atenção. O uso eficiente dos recursos garante a capacidade de conseguir um expressivo aumento na oferta de alimentos com baixa expansão da área cultivada, por exemplo. Neste tema ainda, o setor tem uma relevante contribuição, expressada nas metas de redução de emissão de gases do efeito estufa, que o Brasil assumiu na 21.ª Conferência do Clima (COP21) em Paris no final do ano passado. A recuperação de 15 milhões de hectares de pastagens degradadas é um dos pontos de ação para reduzir as emissões, e, consequentemente, aumentar a oferta de carne sem a necessidade de abrir novas áreas – além do reforço à oferta equilibrada do etanol, biodiesel e biomassa energética.

O momento é de gerar uma estrutura matricial para todos os segmentos, de maneira que seja possível estimular ganhos de produtividade, eficiência na gestão de recursos e investimentos em inovação e tecnologia. A integração, com senso republicano, acelera as ações, corta caminhos em atalhos relevantes à urgência requerida.

A visão pragmática do setor, levando em consideração os diferenciais de escalas das cadeias produtivas, os riscos das intempéries climáticas e a diversidade dos ambientes de produção, necessita também de políticas de Estado, além do arrojo já comprovado do agronegócio brasileiro. Afinal, insumos, bens de capital, agricultura e indústria são partes do mesmo grande negócio nacional, integrados.

Ainda que sem as condições mais favoráveis, o Brasil segue como protagonista nos temas relacionados à segurança alimentar, à produção de commodities e ao uso de energia renovável. O agronegócio brasileiro espera ser, de fato, prioridade nas ações, porque nos discursos já está sendo.

*Luiz Carlos Corrêa Carvalho é presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG)

Opinião por Luiz Carlos Corrêa Carvalho