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O Brasil de passo errado

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Por Redação
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O Brasil continua com o passo errado, incapaz de acompanhar a recuperação da economia mundial e condenado, quase certamente, a permanecer no grupo retardatário por bom tempo. Depois de um crescimento quase nulo no ano passado, o Produto Interno Bruto (PIB) do País deverá encolher 0,8% em 2015 e aumentar apenas 1,1% no próximo ano, segundo as novas projeções da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). No último cenário, divulgado em março, a contração estimada para este ano era de 0,5%. Para a economia mundial a previsão é de crescimento de 3,2% em 2015 e de 3,8% em 2016. Os principais motores serão os Estados Unidos, com taxas de expansão de 2% e 2,8% nos dois anos, e a China, com 6,8% e 6,7%.

A redução do ritmo chinês é consequência principalmente de reestruturação interna – maior ênfase para o mercado interno e menor dependência das exportações, embora o país ainda mantenha a liderança no comércio internacional. A nova estimativa da OCDE para o Brasil é mais otimista que as do mercado e do governo brasileiro. A mediana das projeções do mercado, na semana passada, indicava contração econômica de 1,27% em 2015. Dias antes, ao apresentar a revisão do orçamento, com redução de R$ 69,9 bilhões nos gastos programados, o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, havia anunciado a nova expectativa para o PIB – uma retração de 1,2%. No mesmo exercício a inflação prevista para o ano havia passado de 6,49% para 8,26%.

O cenário da OCDE é interessante menos pela projeção do PIB, mais otimista que os números correntes no Brasil, do que pela reafirmação do contraste entre as condições do Brasil e as da maior parte do mundo – tanto observadas quanto esperadas. Muitas economias em desenvolvimento vêm sendo e continuarão sendo afetadas pela redução de preços dos produtos básicos. Além disso, enfrentam a piora das condições internacionais de financiamento, principalmente por causa das mudanças na política monetária dos Estados Unidos.

Muito frouxa durante vários anos, essa política se tornou menos expansionista desde o ano passado. A alteração (ou normalização, como dizem os especialistas) será complementada, dentro de alguns meses, por uma elevação de juros. As mudanças – efetivadas e programadas – já afetaram os movimentos de capitais e tornaram mais difícil o acesso aos mercados financeiros.

A depreciação das commodities, a menor demanda chinesa por importações e as novas condições do mercado financeiro internacional têm afetado boa parte dos países latino-americanos, incluído o Brasil. Mas, no caso brasileiro, os economistas da OCDE chamam a atenção também para importantes problemas internos, como a deterioração das contas públicas nos últimos anos, a elevação da dívida oficial, as deficiências da infraestrutura e o baixo investimento. Todos esses fatores, associados ainda à fraca formação da mão de obra, reduziram o potencial de crescimento do País.

Maior investimento, essencial para o aumento do potencial, dependerá, segundo a OCDE, da volta da confiança na política econômica e nas perspectivas do País. O investimento em capital fixo – máquinas, equipamentos e construções – diminuiu 4,3% em 2014 e diminuirá mais 3,7% neste ano, segundo as projeções.

Nenhum desses problemas é novidade para quem analisa a economia brasileira com base em boas informações e sem lentes ideológicas. Mas foram repetidamente negados pelas autoridades nos últimos anos, embora se agravassem de forma indisfarçável. A presidente Dilma Rousseff tem ainda atribuído as dificuldades nacionais às condições externas, sem reconhecer, pelo menos publicamente, a enorme coleção de erros internos. Mas o ajuste vem sendo conduzido com base em diagnóstico bem mais realista. É incerto o êxito dessa política, rejeitada até pelo partido da presidente. Mas o fim da mistificação, nos principais gabinetes econômicos, é um começo promissor.