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O estado dos Juizados Especiais

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Por Redação
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Criados há mais de duas décadas como alternativa de acesso à Justiça comum, com o objetivo de desafogar o Judiciário e atender a uma demanda reprimida de serviços judiciais, julgando litígios de baixo valor em rito sumário e execução imediata da sentença, os Juizados Especiais acabaram sendo vítimas de seu sucesso.

A demanda foi tão grande que eles hoje se encontram tão congestionados e burocratizados quanto as varas comuns da Justiça Federal e da Justiça Estadual. “Tal qual uma nova via que por algum tempo desafoga o trânsito, mas que é logo eclipsada pelo aumento do tráfego, o desafogo inicial que os Juizados trouxeram se transmudou em novo emperramento”, diz a corregedora nacional de Justiça, Nancy Andrighi, que também é ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ). 

Entre 2012 e 2013, segundo as estatísticas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o número de novos processos na primeira instância da Justiça Estadual cresceu 0,6%. Já nos Juizados Especiais, o aumento foi de 13,5%. Na Justiça Federal, a elevação foi de 0,5% nas varas comuns e de 18,5% nos Juizados Especiais. 

Atualmente, o tempo médio de espera para a primeira audiência é de 168 dias. Já o tempo médio para o julgamento e a execução da sentença é de 200 dias. Em alguns Juizados Especiais Cíveis, especialmente os que discutem questões corriqueiras – como cobranças abusivas por operadoras de telefonia, seguradoras, planos de saúde e empresas de transporte, movimentação indevida em conta corrente feita por bancos e descumprimento de contrato por fornecedores de serviços – a espera para a primeira audiência é de 240 dias. No início da década de 2000, as ações impetradas nos Juizados Especiais Cíveis demoravam, em média, 84 dias para serem julgadas e encerradas. 

Essa crescente morosidade vem deixando frustrados milhões de cidadãos que procuram os Juizados para defender direitos e resolver pendências. “O estado atual dos Juizados reclama medidas urgentes que possam lhes devolver a desenvoltura e a celeridade que a população espera quando busca essa via para a solução de seus conflitos”, diz a ministra Nancy Andrighi. Para identificar os gargalos dos Juizados Especiais, o CNJ encomendou um levantamento a uma equipe de pesquisadores da Universidade de São Paulo, que foi realizado em cinco capitais, escolhidas por apresentarem características distintas do ponto de vista socioeconômico: São Paulo, Florianópolis, Belém, São Luís e Cuiabá. O trabalho identificou os mesmos problemas que já haviam sido constatados há alguns anos por uma pesquisa efetuada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, a pedido do Conselho de Justiça Federal, e por levantamentos realizados pelo Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas Judiciais e pela Escola de Direito de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas. 

Todos esses levantamentos revelaram que os Juizados Especiais se encontram contaminados pelos mesmos problemas da Justiça comum. Ou seja, além do orçamento insuficiente, faltam juízes e servidores técnicos para dar conta do crescente número de ações judiciais e as audiências muitas vezes são realizadas em salas e galpões improvisados. Acima de tudo, falta gestão eficiente. Em vários tribunais, a distribuição dos recursos financeiros é feita sem critérios técnicos e, apesar de alguns Juizados Especiais terem para julgar mais processos do que as varas da Justiça comum, eles recebem apenas entre 10% e 20% do orçamento que o Poder Judiciário dedica à primeira instância. Em alguns Estados, além disso, os Juizados têm de 10% a 15% do dotal de magistrados de primeiro grau e as varas comuns, de 85% a 90%. Por isso, há juízes de varas comuns que acabam recebendo menos processos para julgar, enquanto os juízes dos Juizados Especiais ficam abarrotados de processos.

A criação dos Juizados Especiais democratizou o acesso ao Judiciário e contribuiu para a consolidação da segurança do direito e do império da lei. É por isso que o CNJ tem de tomar medidas mais eficientes para impedir que eles se desfigurem, tornando-se tão morosos quanto as varas comuns.