Imagem ex-librisOpinião do Estadão

O irrealismo do Judiciário

Exclusivo para assinantes
Por Redação
2 min de leitura

Em mais uma demonstração de irrealismo, o Poder Judiciário decidiu aumentar ainda mais sua já inchada máquina administrativa. Só na semana passada, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e sete Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs) enviaram ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) anteprojetos de lei que preveem a criação de mais de 1,5 mil cargos de analistas e técnicos judiciários.

Pela Lei 13.080/15, que estabeleceu as diretrizes para a elaboração do Orçamento da União e foi desenvolvida para impedir que o poder público continue gastando mais do que arrecada, propostas que resultem em aumento de gastos com a folha de pagamento dos 91 tribunais brasileiros têm de ser apreciadas pelo CNJ, antes de serem encaminhadas ao Congresso. Se os anteprojetos forem aprovados pelo plenário, os conselheiros têm de elaborar pareceres circunstanciados que servirão de subsídio à análise dos senadores e deputados nas comissões técnicas do Poder Legislativo.

Apesar da disposição de alguns conselheiros de rejeitar as propostas de ampliação da máquina administrativa, lembrando que o País atravessa uma profunda crise fiscal, o CNJ não resistiu às pressões corporativas. O órgão rejeitou o anteprojeto que previa a criação de gratificação de função para os servidores da Justiça Eleitoral – se fosse aprovado, ele romperia a paridade de carreiras e remuneração do Judiciário. Mas aprovou o anteprojeto encaminhado pelo STJ, que prevê a criação de 670 cargos destinados a diversas áreas da Corte – entre elas, os gabinetes dos ministros, a Secretaria Judiciária e a Secretaria de Controle Interno.

Com jurisdição no Estado do Rio de Janeiro, o TRT da 1.ª Região pediu a criação de 726 cargos e obteve a autorização para criar 115 cargos de analista judiciário, 76 cargos de analista administrativo e 27 cargos de analista para apoio de áreas médicas e de engenharia civil, elétrica e mecânica. Antes da votação, um dos conselheiros alegou que essas atividades são “completamente estranhas tanto à atividade-fim quanto à atividade-meio permanente da Justiça”, mas foi vencido. O TRT dos Estados do Pará e do Amapá teve aprovado o anteprojeto que autoriza a criação de 152 cargos efetivos de servidor, 84 cargos em comissão e 211 funções comissionadas. O TRT de Alagoas teve aprovada a proposta de criação de 2 cargos de magistrado e 67 cargos de serventuários judiciais. Também foram aprovados os pedidos do TRT da Bahia para a criação de 320 cargos de analista, 29 funções comissionadas e 29 cargos em comissão, e do TRT de São Paulo, para a criação de 407 cargos de analista, 204 cargos de nível técnico e 1.213 funções comissionadas.

Além de evidenciar a alienação do Poder Judiciário, que insiste em aumentar gastos com pessoal num período de ajuste fiscal, todos esses projetos primam pela falta de racionalidade em matéria de política pública. Desde a aprovação da Emenda Constitucional n.º 45, há 11 anos, foram introduzidos na legislação processual vários mecanismos – como a súmula vinculante e o princípio da repercussão geral – para encerrar o julgamento das chamadas ações repetitivas já na primeira instância e reduzir drasticamente o número de recursos impetrados nos tribunais superiores. As estimativas dos processualistas são de que, a médio prazo, essas inovações reduzam significativamente o número de ações em tramitação nas diferentes instâncias dos tribunais. Por isso, as propostas dos TRTs e do STJ de ampliar o número de serventuários não fazem sentido.

Infelizmente, o Poder Judiciário – que frequentemente faz gastos perdulários e não revela bom senso na definição de suas prioridades – continua agindo e decidindo como se os recursos públicos fossem infinitamente fartos. Mais uma vez, a instituição se esquece de que, apesar de os Poderes serem politicamente independentes, no plano financeiro o caixa é um só e a responsabilidade sobre o que entra e o que sai é do Executivo. E, neste momento, ele se encontra desesperado e disposto a quase tudo para tentar fechar as contas públicas.