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O julgamento

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Por Redação
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Oito meses depois do início do processo, começa hoje no Senado o julgamento final do impeachment da presidente Dilma Rousseff. De acordo com o cronograma estabelecido pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Ricardo Lewandowski – que preside também o julgamento desde a fase da pronúncia –, tudo será decidido até o dia 31. Os votos de pelo menos 54 dos 81 senadores decretarão a perda definitiva do mandato de Dilma e a suspensão de seus direitos políticos por 8 anos. Se o impeachment não atingir o quórum qualificado, o processo será arquivado e Dilma Rousseff reassumirá imediatamente a Presidência da República.

De acordo com todos os prognósticos, inclusive de quem se opõe ao impeachment, a condenação de Dilma Rousseff é líquida e certa. De pouco adiantará, para efeitos práticos, que à acusada seja permitido apresentar suas razões, agora pessoalmente, em atendimento ao princípio constitucional da ampla defesa.

Aproxima-se de seu desfecho, assim, o conturbado processo que, ao permanecer rigorosamente dentro dos parâmetros legais e do rito estabelecido pelo Poder Judiciário para a adoção da medida extrema da cassação de um mandato eletivo, reafirma a solidez das instituições democráticas brasileiras e abre perspectiva para a criação de um novo consenso para a reconstrução nacional.

Hoje serão ouvidas as testemunhas a favor e contra o impeachment, logo depois que for superada a previsível tentativa dos defensores da afastada de procrastinar ao máximo os trabalhos com a repetição das mesmas questões de ordem que têm levantado em vão desde a primeira fase do processo. É compreensível: trata-se de uma rara oportunidade para parlamentares ávidos por promoção pessoal se exibirem diante das câmeras de televisão em rede nacional. Oportunidade de que se aproveitarão, também, os defensores do impeachment. Todos, a favor e contra, serão vistos e ouvidos por uma massa de eleitores que a esta altura estão fartos de retórica e ansiosos pelo encerramento desse lamentável episódio da história da República.

Na próxima segunda-feira, Dilma Rousseff comparecerá ao plenário para defender-se. Quando decidiu que iria pessoalmente à sessão, Dilma imaginava que poderia impor a condição de não ter de responder a questionamentos. Essa possibilidade, que só poderia ser cogitada por uma mente autoritária, foi obviamente negada. Assim, ela terá de se haver com perguntas sobre como e por que se dispôs a convalidar com sua presença um julgamento que insiste em definir como “golpe”. Ou por que se compromete a, se for reconduzida à Presidência, convocar um plebiscito para definir a realização de eleições presidenciais antecipadas, o que implicaria sua renúncia e a consequente confissão de fracasso na missão que lhe foi atribuída por 54 milhões de brasileiros.

Se todas as previsões se confirmarem, o Brasil entrará no mês de setembro com um governo livre da incômoda condição de provisório e presumivelmente mais apto a enfrentar politicamente o enorme desafio de propor, ver aprovadas pelo Congresso quando for o caso, e implantar com eficácia tanto medidas necessárias ao saneamento das contas públicas e ao equilíbrio fiscal como outras, de caráter estruturante, destinadas a corrigir desvios da gestão pública e a criar condições para a retomada do crescimento econômico com os consequentes benefícios sociais, como a redução do desemprego, a mais amarga herança social do ciclo lulopetista.

Esse é, vale repetir, um enorme desafio, que o governo só poderá enfrentar – e esse é um fundamento essencial do sistema democrático – na medida em que se mantiver atento às genuínas e espontâneas manifestações do interesse público, sabendo distingui-las das vociferações revoltadas ou populistas. E se souber também promover, com coragem e sem concessões demagógicas, o sentimento de união nacional, de unidade na diversidade, capaz de relegar ao passado o período negro da História em que o Brasil foi dividido entre “nós” e “eles”.