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O otimismo do BC

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Por Redação
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A economia brasileira crescerá 7,3% neste ano e se manterá entre as mais dinâmicas do mundo, segundo a nova projeção do Banco Central (BC), divulgada em seu relatório trimestral de inflação. Nas duas edições anteriores, o crescimento previsto era de 5,8%. O motor da expansão será o mercado interno, porque a maior parte dos outros países continuará em marcha lenta. O Brasil e outros emergentes, como a China e a Índia, se manterão como os principais focos de atividade. O tom geral do relatório é muito otimista em relação ao País e só um risco importante é apontado: as pressões inflacionárias continuam fortes. A estimativa de inflação para 2010 foi elevada de 5,2% para 5,4%, quase um ponto porcentual acima do centro da meta, de 4,5%. O relatório é um exame amplo da economia brasileira e de suas perspectivas. Um dos seis capítulos é dedicado ao cenário internacional ? nível de atividade, funcionamento do mercado financeiro, evolução dos preços de commodities e fatores de risco. Segundo as projeções, a indústria de transformação crescerá 12,3% neste ano. A construção civil, 13,3%. Serão os segmentos mais dinâmicos da economia em 2010. Projetos de longo prazo, como o do pré-sal e o da Copa do Mundo de 2014 contribuirão para um alto nível de atividade nos próximos anos. Do lado da demanda, o investimento será o item de maior expansão neste ano, com variação de 17,1%, de acordo com o relatório. A exportação de bens e serviços aumentará 12,6%, mas essa evolução será mais que contrabalançada pelo aumento da importação, 27,8%. A contribuição do setor externo para a formação do PIB será negativa, como foi em 2009. O otimismo quanto à expansão do investimento é neutralizado, no entanto, quando se chega ao capítulo sobre inflação. Para atender à demanda, a indústria é forçada a aumentar o uso dos fatores de produção. Quando isso ocorre, os preços tendem a subir. As sondagens industriais têm mostrado níveis elevados ? acima de 80% ? de uso da capacidade instalada. Representantes da indústria têm procurado negar, no entanto, o risco de ocupação excessiva. Para sustentar seu ponto de vista, chamam a atenção para o aumento das compras de máquinas e equipamentos. Com a expansão da capacidade produtiva, argumentam, o risco de inflação é neutralizado e o aumento de juros se torna desnecessário. Mas esse arrazoado tem sido insuficiente para impedir os aumentos decididos pelo Comitê de Política Monetária (Copom). E a análise apresentada no Relatório de Inflação reforça a expectativa de novas altas da taxa básica de juros. Quanto a esse ponto, a mensagem pode não ser tranquilizadora para os empresários. Mas pelo menos com o Ministério da Fazenda não deve haver atritos importantes. O tom do relatório é otimista em relação à política fiscal. Segundo o documento, a meta de superávit primário de 3,3% do PIB deverá ser alcançada ? embora se admita a hipótese de um desconto de até 1,12 ponto porcentual, a depender da execução de obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Os autores do trabalho chegam a admitir a possibilidade de contenção dos gastos correntes. Ou sofreram um violento surto de otimismo ou decidiram adotar um tom conciliador, desistindo de chamar a atenção para a execução frouxa do orçamento. Os últimos comentários francos sobre o assunto resultaram em atritos com o pessoal da Fazenda. O otimismo parece realmente excessivo no capítulo sobre as contas externas. Segundo as projeções, o superávit comercial ficará em US$ 13 bilhões e o déficit em conta corrente chegará a US$ 49 bilhões, o dobro do registrado em 2009 (US$ 24,3 bilhões). Com a demanda interna aquecida e o mercado externo ainda fraco, as exportações crescerão bem menos que as importações e, além disso, o déficit na conta de serviços aumentará. O déficit de US$ 49 bilhões será financiado facilmente, segundo as estimativas, pelo ingresso de investimentos ? diretos e em carteira ? e com a rolagem da dívida externa. Sobre isso não há dúvida, mas o financiamento será de qualidade inferior, porque o investimento direto estrangeiro, destinado ao setor produtivo, deverá ficar em US$ 26 bilhões. Será preciso cobrir a diferença com recursos mais instáveis ? de fato, especulativos. Não é bom depender desse dinheiro.