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O País em modo de espera

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Por Redação
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A incerteza política é hoje o maior entrave à recuperação da economia brasileira. A perspectiva de um novo governo, depois de anos de incompetência e de irresponsabilidade, trouxe alguma esperança ao empresariado. Mas o País continua em recessão, com produção e consumo ainda em queda. Os mais otimistas apenas se arriscam a apontar algum prenúncio de estabilização, como o ajuste quase completo dos estoques industriais. Os indicadores de confiança têm melhorado, embora os números permaneçam, de modo geral, em território negativo. Isso é insuficiente para a inversão do cenário, como observou o gerente executivo de Política Econômica da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Flávio Castelo Branco. Ficar mais confiante é só o começo. É preciso mais para induzir o empresário a novos compromissos e, de modo especial, a novos investimentos.

Esse algo mais depende tanto do Congresso quanto do governo por enquanto provisório. O presidente em exercício Michel Temer prometeu arrumar as contas públicas e já propôs a criação de limites para o aumento do gasto governamental. Também prometeu apresentar em breve uma proposta de reforma da Previdência. 

Mas precisa ir mais longe para consolidar a confiança de investidores e produtores. Para começar, tem de propor metas significativas, e confiáveis, para a gestão do Orçamento nos próximos dois anos e meio. Mostrar determinação será muito importante depois de haver assumido generosos compromissos de gastos e de facilidades fiscais. Do lado do Congresso, a missão decisiva, nesta fase, será a conversão do governo provisório em efetivo, descartando a volta da presidente afastada.

Se as duas condições forem cumpridas, será criado o cenário para a retomada firme dos negócios e para a redução do desemprego. Até o fim do processo de impeachment haverá insegurança, até porque o Executivo estará sujeito a muita pressão por barganhas. Serão mais de 40 dias de tensão e, para os empresários, de muita dúvida sobre novas iniciativas de produção, de formação de estoques e, em alguns casos, de retomada do investimento.

Enquanto se espera essa travessia, as condições da economia se agravam, talvez mais lentamente do que antes, em alguns setores, mas, de toda forma, sem limite previsível para a estabilização, muito menos para o início da recuperação. Em junho, o movimento do comércio, estimado com base nas consultas à base de dados da Serasa Experian, foi 6,7% menor que o de um ano antes. Na comparação do primeiro semestre deste ano com o primeiro de 2015, a queda, de 8,3%, foi a maior desde o apagão de 2002, quando o recuo chegou a 6,9%.

Os indicadores industriais de maio, calculados pela CNI, mostraram novas quedas mensais do faturamento real (3,8%), das horas de trabalho na produção (3,6%), do emprego (0,8%) e do rendimento médio real (1%). O uso da capacidade instalada também diminuiu, mas a variação foi mais tênue, de 77,1% em abril para 77% em maio, nível mais baixo desde 2013. O emprego foi o mais baixo desde fevereiro de 2006.

Levantamentos de entidades setoriais também apontam condições muito ruins. Segundo a associação da indústria eletroeletrônica, a produção aumentou 1,2% de abril para maio, mas ficou 12,1% abaixo do nível de um ano antes. Na comparação dos períodos de janeiro a maio a queda chegou a 21,6%.

A indústria de veículos, muito dependente do crédito para as vendas finais, terá de percorrer um longo caminho de recuperação. A produção de junho foi 2,6% maior que a de maio, mas ficou 19,2% abaixo da registrada 12 meses antes. 

Alguns segmentos industriais têm conseguido exportar, em parte com ajuda do câmbio, em parte graças às próprias condições de competitividade. Mas são exceções. Com baixíssimo investimento, a maior parte da economia tem perdido produtividade e capacidade de competir e de crescer. Será necessário um enorme trabalho de reconstrução. Falta soar o sinal de partida.