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O suspense americano

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Por Redação
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A economia americana cresceu 2,2% no ano passado, completou 14 trimestres consecutivos de expansão e contribuiu de novo para a recuperação global. Mas seu desempenho em 2013 e nos próximos anos continua incerto, enquanto governo e oposição negociam cortes no orçamento e um possível aumento de impostos para os contribuintes mais ricos. Uma redução de gastos de US$ 85 bilhões foi programada para vigorar a partir de março e seus primeiros efeitos devem ser sentidos em abril. Se nada for feito, a expansão da atividade será comprometida e o desemprego tenderá a subir. Um acordo nas próximas semanas poderá interromper ou limitar os danos. Para isso, o presidente Barack Obama terá de vencer uma obstinada resistência da maioria oposicionista na Câmara de Representantes. O custo de uma política fiscal restritiva já foi sentido no trimestre final de 2012, quando o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu apenas 0,1%. A estimativa inicial havia indicado uma contração de 0,1%. A revisão das contas acabou apontando um resultado positivo, embora menor que o previsto no mercado financeiro (0,5%). A perda de ritmo, depois do crescimento de 3,1% no trimestre anterior, foi em grande parte causada por uma redução de 14,8% nos gastos federais. As verbas aplicadas na defesa diminuíram 22% no período. Na média anual, essas verbas foram 3,1% menores que as de 2011. O dado mais positivo do ano foi a expansão de 9,6% do investimento privado. Corporações e famílias investiram 12,1% mais em residências, 7,7% mais em outros tipos de construções e 6,9% mais em equipamentos e software. O crescimento foi puxado, naturalmente, pelo avanço de 1,9% do consumo privado. As condições de emprego melhoraram consideravelmente durante o ano, apesar de algumas oscilações, e isso deve ter influenciado o ânimo dos consumidores. Mas o grande aumento do valor investido é um dado especialmente importante porque denota maior confiança na recuperação da economia. Também é significativa a reação do mercado imobiliário, devastado pelo estouro da bolha de crédito. O comércio exterior continuou em crescimento. O valor das exportações de bens e serviços aumentou 3,3%. O das importações, 2,4%. O déficit externo diminuiu, mas o mercado americano continuou absorvendo um enorme volume de bens e serviços produzidos em outros países e contribuindo, assim, para a reativação de outras economias. O Brasil foi um dos beneficiários da recuperação americana. As exportações de mercadorias brasileiras para os Estados Unidos, no valor de US$ 26,8 bilhões, foram 3,5% maiores que as do ano anterior, enquanto o valor total exportado diminuiu 5,3%. Metade das vendas do Brasil ao mercado americano foi constituída de produtos manufaturados. É cada vez mais difícil entender por que o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em fim de mandato, se declarou feliz por ver a economia americana em recessão. Apesar de suas notórias deficiências de informação e de sua péssima assessoria na área internacional, ele deveria ter alguma ideia da importância global da economia americana e de sua relevância - direta e indireta - para o Brasil. Outros grandes compradores de produtos brasileiros, como a China, por exemplo, também dependem da prosperidade das economias ocidentais, a começar pela maior de todas. Todas as pessoas sensatas, em todo o mundo, têm motivos fortíssimos, portanto, para acompanhar com interesse as negociações entre o governo americano e a oposição a respeito dos cortes orçamentários e das fórmulas para reduzir, nos próximos anos, o endividamento público. Mas a experiência americana de 14 trimestres consecutivos de crescimento, apesar da crise interna e das dificuldades globais, contém também lições interessantes para autoridades de países como o Brasil. Mais uma vez foi demonstrado o valor da flexibilidade econômica. Essa característica facilita a adaptação a novas situações e a novos desafios. Vale a pena refletir, também, sobre a rápida elevação do investimento privado. Os americanos estão construindo agora vantagens competitivas para quando o mundo sair da crise. Como estará o Brasil nesse momento?