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Ofensiva de charme do Irã

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Por Redação
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Logo depois de chegar à Casa Branca, em 2009, o presidente Barack Obama propôs em carta ao líder supremo do Irã, aiatolá Ali Khamenei, a retomada do diálogo entre Washington e Teerã. A mensagem não ecoou. De seu lado, depois de se reeleger fraudulentamente em 2010, o presidente Mahmoud Ahmadinejad escreveu a Obama. Mas, àquela altura, tinha se esvaído o interesse americano por uma saída negociada para o contencioso em torno do programa nuclear iraniano. Seguiu-se um prolongado inverno diplomático, enquanto se tornavam cada vez mais sufocantes as sanções ao Irã por descumprimento do Tratado de Não Proliferação (TNP) de que é signatário. As exportações iranianas de petróleo caíram de 2,4 bilhões de barris diários em 2011 para menos de 1 milhão, atualmente. Ainda pior do que isso para a economia nacional foi a exclusão do país do chamado sistema Swift de transferência internacional de valores, bloqueando assim o seu acesso à rede global de movimentações financeiras. Nesse quadro, os iranianos elegeram em junho um presidente reformista, o clérigo Hassan Rohani, cuja formação acadêmica ocidental (cursou Direito na Universidade de Glasgow, na Escócia) e experiência diplomática (negociador-chefe da questão nuclear junto à União Europeia) contrastam com a mente tacanha do fanático antecessor. Pregando a destruição de Israel e culpando o "Grande Satã" americano por todos os males do mundo, ele transformara o Irã em um Estado-pária, com aliados apenas na Venezuela de Hugo Chávez e na Síria de Bashar al-Assad. Pelo que reiterou na campanha, Rohani deixou claro que pretendia livrar o país da herança maldita de Ahmadinejad, arejando-o por dentro e abrindo-o para o exterior. Há três semanas, Obama escreveu-lhe, prometendo, segundo Teerã, aliviar as sanções econômicas, se o seu governo demonstrar o desejo de "cooperar com a comunidade internacional, cumprir os seus compromissos e remover ambiguidades". Segundo a Casa Branca, a carta não contém promessas de curto prazo, muito menos propostas detalhadas. Mas a primeira mensagem direta de um presidente americano a um homólogo iraniano levantou uma ventania de otimismo no Irã. A carta - "positiva e construtiva", como a qualificaria Rohani - foi lida em voz alta para o aiatolá Khamenei e esmiuçada pelos seus interlocutores. Fontes da hierarquia de Teerã comentaram com jornalistas ocidentais que pareciam enxergar os primeiros traços de um círculo virtuoso nas relações com Washington. Começou então uma ofensiva de charme destinada a mostrar que os iranianos estavam fazendo a sua parte. Pela primeira vez, Khamenei divulgou mensagem de congratulações pela passagem do ano-novo judaico. Onze presos políticos foram soltos. E Rohani se fez entrevistar por uma jornalista da rede americana NBC, a quem assegurou que, "em nenhuma circunstância buscaremos ter armas de destruição em massa, incluindo armas nucleares". Isso não é novidade: o próprio líder supremo já havia observado que o Corão proíbe a fabricação, posse ou uso da bomba atômica. O que chamou a atenção foi Rohani dizer que "tinha plenos poderes e completa autoridade" para fazer um acordo com o Ocidente. Ele já o tentara nas negociações de 2003 a 2005. Nesse meio tempo, o Irã chegou a suspender o enriquecimento de urânio. Mas as conversações fracassaram - deixando dúvidas sobre a autonomia de Rohani. Agora, a "pasta nuclear" foi transferida ao Ministério do Exterior, para o qual ele nomeou o veterano diplomata Javad Zarif. Obama retribuiu a entrevista de Rohani com outra, à rede Telemundo. Reconheceu que os EUA nunca viram de uma autoridade iraniana a mesma propensão ao diálogo de Rohani. "Devemos testá-la", sinalizou. Na próxima semana, o presidente do Irã estará em Nova York para a Assembleia-Geral da ONU. Obama também. Uma reunião entre eles será um marco dos novos tempos. Eloquente sinal de Teerã, a delegação de Rohani incluirá o deputado Siamak Moreh Sedgh. Ele representa no Parlamento os 25 mil judeus do país.