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Pobres argentinos

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Por Redação
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O governo de Cristina Kirchner bem que tenta esconder a crescente depauperação da Argentina, causada por suas políticas irresponsáveis, mas a realidade insiste em se impor. O problema é que a maquiagem dos números constrangedores, hábito recorrente na Casa Rosada kirchnerista, já não convence mais nem mesmo alguns governistas.O mais recente informe de um centro de pesquisas da Central de Trabalhadores da Argentina (CTA), que é alinhada a Cristina, indica que o número de pobres no país chegou a 18,2% da população no último trimestre do ano passado. Esse porcentual é quatro vezes superior ao índice oficial, que é de apenas 4,7%, verificado no primeiro semestre de 2013 - equivalente ao das principais economias da Europa.Cumprindo o script governista, a CTA até tenta demonstrar em seu relatório que a situação no país é muito melhor hoje do que foi no período anterior ao dos Kirchners. Diz, por exemplo, que "a evolução da taxa de pobreza mostra uma forte e sistemática tendência decrescente nos últimos dez anos", caindo de 49,7% em 2003 para 17,8% em 2013. No entanto, a pobreza na Argentina já foi de 16,1% em maio de 1994, depois de atingir 47% em 1989 graças à hiperinflação. Logo, há hoje na Argentina um porcentual maior de pobres do que há 20 anos, quando se implantaram políticas de estabilização da economia, reduzindo o chamado imposto inflacionário - aquele que é pago basicamente pelos que têm menor renda.Com a atual disparada da inflação - cuja medição oficial, também suspeita, aponta para 11% no primeiro trimestre -, as projeções indicam uma reversão da queda da pobreza no país. "Provavelmente a aceleração dos preços após a desvalorização do peso em janeiro de 2014 provoque um incremento das taxas de pobreza e de indigência", admite a CTA. No entanto, a alta já era uma tendência no ano passado, quando o porcentual de pobres, segundo os critérios da central, subiu de 17,4% no primeiro trimestre para 18,2% no quarto trimestre.A CTA recomenda, diante desse quadro, que o governo compense a alta inflacionária com um reajuste dos benefícios sociais, semelhantes ao Bolsa Família. Segundo a central, um desses benefícios, pagos a desempregados, subempregados ou que ganham menos de um salário mínimo, sofreu brutal perda de poder de compra em razão da inflação do primeiro trimestre deste ano, e hoje vale 9,3% menos do que ao ser criado, em 2009.Do mesmo modo, a inflação fez com que o poder de compra do salário mínimo em dezembro de 2013 ficasse 4,7% menor do que o verificado no mesmo período de 2012 - apesar de dois significativos aumentos concedidos no ano passado, de 7,7% em fevereiro e de 14,8% em agosto.Em lugar de admitir o problema, o governo Cristina reagiu como de hábito - acusando a "oposição" de distorcer os números sobre a pobreza, embora a CTA não seja de oposição. Os índices da CTA são até generosos, perto dos aferidos por outros institutos. Uma conceituada pesquisa da Universidade Católica Argentina diz que a pobreza na Argentina é de 27,5%, enquanto a Confederação Geral do Trabalho (CGT), rompida com Cristina, calcula esse índice em 30,9%.Seja como for, parece claro, a esta altura, que são simplesmente falsos os números oferecidos pelo governo a partir dos cálculos do Instituto Nacional de Estatísticas e Censos (Indec) - que está sob intervenção do governo desde 2007, quando o então presidente, Néstor Kirchner, resolveu adaptar os indicadores à sua narrativa heroica. O último dado do Indec sobre a pobreza é do primeiro semestre de 2013 - por ordem do ministro da Economia, Axel Kicillof, a divulgação dos números do segundo semestre foi suspensa, talvez porque nem torturados os números digam o que o governo deseja.É assim, escondendo dados para fingir que tudo vai bem, que a Argentina cava mais fundo ainda o buraco em que se encontra desde que acreditou no conto populista do kirchnerismo - em que os pobres somem num passe de mágica.