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Realismo para crescer

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Por Redação
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O caminho para o crescimento, depois de anos de estagnação e até de retrocesso, passará obrigatoriamente pelos ganhos de produtividade e por uma inserção mais ampla – e mais inteligente – no mercado internacional. Para isso será preciso passar a limpo, e até renegar em muitos aspectos, políticas em vigor no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff e herdadas em parte da gestão de seu padrinho e grande eleitor, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Tratados de forma diplomática, mas bastante clara, esses pontos têm aparecido com frequência nos pronunciamentos do ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Armando Monteiro Neto. Houve nos últimos anos “confusão entre política anticíclica e política industrial”, disse ele em palestra na Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan). “Agora queremos ter foco maior na questão da produtividade”, acrescentou. Ele poderia ter sido mais corrosivo se fosse aos detalhes. As ações anticíclicas deixaram de ser funcionais depois de 2009 ou, no máximo, desde o segundo semestre de 2010, até porque a crise atingiu o Brasil sem causar grandes danos. Além de ser um fracasso como política de crescimento, a insistência nos estímulos ao consumo e na distribuição seletiva de benefícios causou inflação, devastou as contas públicas, corroeu o superávit comercial e abriu um rombo na conta corrente do balanço de pagamentos. Sem explicitar esses pontos, muito bem conhecidos, o ministro concentrou-se numa lista mínima de problemas importantes e de ações necessárias. É preciso, segundo ele, “reposicionar a política industrial”, mexendo em questões regulatórias, tributárias e financeiras. Será necessário voltar a política para as questões microeconômicas, isto é, para as condições de operação das empresas em seus mercados. Será indispensável, poderia ter acrescentado, retomar o debate, anunciado há mais de uma década e logo abandonado, da famosa agenda microeconômica. As agendas da produtividade e da inserção internacional acabam sempre entrelaçadas, nos pronunciamentos do ministro, e isso é natural. Não se pode pensar numa inserção maior no comércio e nas cadeias internacionais de formação de valor sem levar em conta requisitos de eficiência e de competitividade. Em contrapartida, seria ilusório pensar numa política permanente de competitividade sem levar em conta a importância do comércio como fonte de estímulos, de ganhos de escala, de modernização e de eficiência para as empresas. O incontornável ajuste das contas públicas imporá limites, por algum tempo, à execução de políticas de apoio à modernização empresarial e à expansão do comércio. Mas assim mesmo será necessário, segundo o ministro, lançar em breve um Plano Nacional de Exportações. Sua expectativa, acrescentou, é anunciá-lo no dia 23. Será necessário fortalecer os instrumentos de seguros e garantias e dispor de um reforço para o Programa de Financiamento à Exportação (Proex), apesar das dificuldades do Tesouro. Mas o plano irá além do aperfeiçoamento desses meios e incluirá propostas de mudanças estruturais, a começar pela tributária. Uma boa reforma dos tributos, promessa jamais cumprida nos últimos 20 anos, será politicamente complicada. Para essas e outras alterações será preciso, segundo o ministro, criar uma “visão minimamente convergente” sobre a agenda do crescimento. Será, poderia acrescentar, tarefa para todo o governo. Mas a agenda vai mais longe e inclui uma revisão da diplomacia comercial, com maior atenção a parceiros de grande relevância, como os países mais desenvolvidos. Também neste ponto, embora de forma diplomática, a proposta é abandonar o terceiro-mundismo inaugurado em 2003. A estratégia deve incluir uma reavaliação do funcionamento do bloco regional. O casamento com o Mercosul, disse o ministro, é indissolúvel, mas sempre se pode, acrescentou, discutir a relação. É difícil dizer se a presidente Dilma Rousseff será tocada por esse sopro de realismo. Ela continua atribuindo a crise brasileira a fatores externos e à seca.